Audre Lorde

Audre Lorde

Audrey Geraldine Lorde foi uma escritora feminista, mulherista, lésbica e ativista dos direitos civis. Norte-americana de descendência caribenha. Lorde teve entre seus esforços mais notáveis foi o trabalho militante com as mulheres afro-alemãs na década de 1980. Em seus textos, abordou questões relacionadas aos direitos civis, racismo, feminismo, mulherismo e opressão. Seu trabalho enquadra-se no liberalismo social, abordando a sexualidade numa perspectiva revolucionária. Em resposta às críticas do conservador Jesse Helms, assim se expressou:

1934-02-18 Nova Iorque
1992-11-17 Saint Croix
11910
0
7


Alguns Poemas

Fogo pendente

Tenho quatorze anos
e minha pele me traiu
o menino que não posso viver sem
ainda chupa o dedo
em segredo
me pergunto por que meus joelhos
estão sempre tão cinzentos
e se eu morrer
antes de amanhecer
mama está no quarto
com a porta fechada.

Eu preciso aprender a dançar
a tempo para a próxima festa
meu quarto é pequeno demais pra mim
considere se eu morro antes da formatura
eles cantarão melodias tristonhas
mas ao fim
dirão a verdade sobre mim
Não há nada que eu queira fazer
e coisas demais
que precisam ser feitas
mama está no quarto
com a porta fechada.

Ninguém nem para pra pensar
no meu lado nisso
Eu devia ter entrado pro Time de Matemática
minhas notas eram melhores que as dele
por que eu tenho que ser
aquela
que usa aparelho?
não tenho nada para vestir amanhã
será que viverei o suficiente
para crescer
e mama está no quarto
com a porta fechada.

(tradução de Ricardo Domeneck)

:

Hanging Fire
Audre Lorde

I am fourteen
and my skin has betrayed me
the boy I cannot live without
still sucks his thumb
in secret
how come my knees are
always so ashy
what if I die
before morning
and momma's in the bedroom
with the door closed.

I have to learn how to dance
in time for the next party
my room is too small for me
suppose I die before graduation
they will sing sad melodies
but finally
tell the truth about me
There is nothing I want to do
and too much
that has to be done
and momma's in the bedroom
with the door closed.

Nobody even stops to think
about my side of it
I should have been on Math Team
my marks were better than his
why do I have to be
the one
wearing braces
I have nothing to wear tomorrow
will I live long enough
to grow up
and momma's in the bedroom
with the door closed.


Uma mulher fala

A lua marcada e tocada pelo sol
minha mágica é ágrafa
mas quando o mar der as costas,
deixará para trás meu formato.
Não busco favor
intocado pelo sangue
implacável como a praga do amor
permanente como meus equívocos
ou meu orgulho
Eu não misturo
amor com piedade
nem ódio com desdém
e se você me conhecesse
olhe dentro das entranhas de Urano
onde os oceanos sem sossego calcam

Eu não habito
em meu nascimento nem em minhas divindades
que sou sem idade e meio-formada
e ainda em busca
de minhas irmãs
bruxas em Daomé
me vestem em seus tecidos em camadas
como nossa mãe fazia
de luto.

Eu sou mulher
há muito tempo
cuidado com meu sorriso
Eu sou dissimulada, mágica velha
e a fúria nova do meio-dia
com todos os teus futuros largos
em promessa
Eu sou
mulher
e não branca

(tradução de Ricardo Domeneck)

:

A Woman Speaks
Audre Lorde

Moon marked and touched by sun
my magic is unwritten
but when the sea turns back
it will leave my shape behind.
I seek no favor
untouched by blood
unrelenting as the curse of love
permanent as my errors
or my pride
I do not mix
love with pity
nor hate with scorn
and if you would know me
look into the entrails of Uranus
where the restless oceans pound.

I do not dwell
within my birth nor my divinities
who am ageless and half-grown
and still seeking
my sisters
witches in Dahomey
wear me inside their coiled cloths
as our mother did
mourning.

I have been woman
for a long time
beware my smile
I am treacherous with old magic
and the noon's new fury
with all your wide futures
promised
I am
woman
and not white.

Uma litania para a sobrevivência

Para aqueles entre nós que vivem no litoral
em pé frente às arestas constantes da decisão
cruciais e sós
para aqueles entre nós que não podem dar-se ao luxo
dos sonhos passageiros da decisão
que amam de passagem por soleiras
nas horas entre auroras
olhando para dentro e para fora
no instante antes e depois
buscando um agora que possa gerar
futuros
como pão na boca de nossos filhos
para que seus sonhos não reflitam
a nossa morte:
Para aqueles entre nós
que foram impressos com o medo
como uma linha tênue no centro de nossas testas
aprendendo a temer com o leite de nossas mães
pois por esta arma
esta ilusão de alguma segurança a ser achada
os de passos pesados esperavam silenciar-nos
Para todos nós
esse instante e esse triunfo
Nunca fomos destinados a sobreviver.
E quando o sol se ergue temos medo
que talvez não permaneça
quando o sol se põe temos medo
que talvez não se erga de manhã
quando nossos estômagos estão cheios temos medo
da indigestão
quando nossos estômagos estão vazios temos medo
que talvez nunca mais comamos
quando nós amamos temos medo
que o amor desaparecerá
quando estamos sós temos medo
que o amor jamais voltará
e quando falamos temos medo
que nossas palavras não sejam ouvidas
nem benvindas
mas quando estamos em silêncio
ainda assim temos medo
Então é melhor falar
lembrando-nos
de que nunca fomos destinados a sobreviver
(tradução de Ricardo Domeneck)
:
A litany for survival
Audre Lorde
For those of us who live at the shoreline
standing upon the constant edges of decision
crucial and alone
for those of us who cannot indulge
the passing dreams of choice
who love in doorways coming and going
in the hours between dawns
looking inward and outward
at once before and after
seeking a now that can breed
futures
like bread in our children's mouths
so their dreams will not reflect
the death of ours:
For those of us
who were imprinted with fear
like a faint line in the center of our foreheads
learning to be afraid with our mother's milk
for by this weapon
this illusion of some safety to be found
the heavy-footed hoped to silence us
For all of us
this instant and this triumph
We were never meant to survive.
And when the sun rises we are afraid
it might not remain
when the sun sets we are afraid
it might not rise in the morning
when our stomachs are full we are afraid
of indigestion
when our stomachs are empty we are afraid
we may never eat again
when we are loved we are afraid
love will vanish
when we are alone we are afraid
love will never return
and when we speak we are afraid
our words will not be heard
nor welcomed
but when we are silent
we are still afraid
So it is better to speak
remembering
we were never meant to survive
Audre Lorde foi uma poeta americana, nascida em Nova Iorque a 18 de fevereiro de 1934, em uma família de imigrantes do Caribe. Começou a publicar na década de 60, na revista de Langston Hughes, New Negro Poets, USA. Neste período, engajou-se nos movimentos Feminista, Anti-Guerra e dos Direitos Civis. Seu livro de estreia foi The First Cities (1968), publicado pela editora Poet´s Press e editado por Diane di Prima. Seu segundo livro, de 1970, foi Cables to rage, seguido de volumes como From a Land Where Other People Live (1973), Coal (1976), Between Our Selves (1976), The Black Unicorn (1978) e The Cancer Journals (1980). Entre 1984 e 1992, ano de sua morte, a poeta viveu e trabalhou em Berlim, Alemanha, período sobre o qual a diretora Dagmar Schultz lançou, no ano passado, o documentário Audre Lorde: The Berlin Years (1984 - 1992).
 
 O ativismo feminista de Audre Lorde foi importante e polêmico, ao acusar o Movimento Feminista norte-americano, dominado por ensaístas e ativistas brancas, de ignorar a questão racial do problema, e por focar-se nas experiências de mulheres brancas da classe média. Audre Lorde insistiu que questões de raça, sexualidade, idade, classe e até mesmo saúde influíam e definiam as experiências particulares de cada mulher, e precisavam, portanto, ser abordadas de formas específicas. Suas ideias influíram sobre o conceito de interseccionalidade nos estudos políticos da opressão contra minorias. No documentário A Litany for Survival: The Life and Work of Audre Lorde, de Ada Gay Griffin e Michelle Parkerson, Lorde diz:
 
 "Let me tell you first about what it was like being a Black woman poet in the ‘60s, from jump. It meant being invisible. It meant being really invisible. It meant being doubly invisible as a Black feminist woman and it meant being triply invisible as a Black lesbian and feminist."
 
 Lutando contra o câncer desde 1978, primeiro o câncer de mama (o que exigiria uma mastectomia), e depois no fígado, Audre Lorde morreu a 17 de novembro de 1992.
 
--- Ricardo Domeneck
 
 
Audre Lorde - There Is No Hierarchy Of Oppressions
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Introducing... Audre Lorde
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