Constelação de nós e de estrelas da manhã, passados

Enredo pouco compreendo
com os quais nesses retratos me encontro
seja o mesmo ou outro de mim
que os configura


pois meus já eram os sapatos calçados
quando me pus a caminhar
e rica a favela e pintura
que tomou minha alma por esposa.


Novela de assunto estéril
personagem dúbia e protagonista
faz de nós caricatura


e põe a acordar os pesadelos
ao que se contenta com perdão ligeiro
às confissões precárias de terço à mão
e muito cartucho à cintura.


Trazemos o olhar afora
no receio de que à volta estejam os demais
testemunha do todo que se mente e embota
aos parcos sentidos de tudo, e de ninguém.


Assim se expõe nessa galeria, pinturas não
confeitarias, que a gula faz comer
ainda que se tenha medo
de ser envenenado por instantes de prazer.


Absurdo é ter por merecer (confesso)
a reputação à prova
de todo o que tem somente a esconder
de si e do outro.


Nunca fui de guardar segredo
tenho feridas em relevo
que me orgulho de as ver sorrir.


Vida mesma é candelabro
velas postas em circunflexo acento
pastel de vento, maçã.


Visa sempre o amanhã
sem cuidar do dia de hoje
a enterrar os dias que se recusou viver.


É uma espécie de oratório
oferenda ou velório
de gente que dorme no quando
sono não lhe pertence mais.


Contenta-se com pouco e canta
vitórias com tanto encanto
a deixar-se enganar o santo
que a reza crer, satisfaz.


Sem paciência, e desespero
na gana de verdadeiro desejo
de ser tudo e capaz.


Tem desprezo por inteiro
de todo quem se expõe receios
que alma vã atrai.


Sou diferente em nada
um desses e todos juntos
que bate atrás de si a porta
e segue adiante, vagabundo.


Contudo às vezes consciente
bato e bato contente
portas que não quero ver abertas.


Pois que dão em salas antevistas
de mesmas caras e sentimentos
com deméritos e unguentos
desvelados de paixão.


Prefiro dessa maneira
não os ter à cabeceira
a guisa de ostentação.


E à vida itinerante
sempre esboço e avante
de cada um de nós


é que me faz de
gato e sapato
põe-me a lavar pratos
sem me dar água ou sabão.


Essa louça rude e precária
dessa fome temerária que faz
de mim e de você


entidades esfomeadas
de pernas cruzadas à beira da estrada
quando o sol levante e chama


- venham gente
venham agora e sem demora
façam valer a escolha e história
que de si vantagens conta


e as contas façam todos
se há razão ou distorção
na soma e subtração
do que se apaga ou pinta.


Sejam as cores dessa paisagem
vida nova ou tempestade
de outro inverno, verão.


Mas sejam cores intensas
com as quais se reclama verossimilhança
à cama posta na varanda
quando brisa morna agita


folhas dessa vegetação agreste
que vem o sol, a peste
de bichas cobrir-lhe
a pintura e restinga.


Mofina escultura de povo
sem opinião ou identidade
que faz de tudo espetáculo
haja graça, drama ou seja
banalidade.


Nada além de tédio da existência
quando se tem noventa aos vinte e sete


e muita virilidade na velhice
que mal dá conta da sandice
de o próprio nome esquecer.


Nós que de viver nos cansamos
mal saídos da infância
amamos e casamos, por dinheiro


importa se para o mundo inteiro, pouco
ou pra se dividir o desgosto
e somar as prestações.


Somos nós sempre os mesmos
desejosos de ser diferente
toda e qualquer gente
que não seja eu ou você.


Pomos vistas aos retratos
de barões calçamos os sapatos
e o resto fica para depois.
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