marialuiza
péssima em auto descrição mas ansiando ser menos autobiográfica. (normalmente é Malu)
2002-05-06 Ceará
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terceiro andar
O beijo dessa tarde de domingo chegou gelado e ríspido, como quem vai dar um abraço e não sabe onde tocar primeiro.
E os olhinhos de janela são inúmeros, rodeiam a minha face, mas não sei se percebem nos meus olhos, quais são os olhos que eu quero olhar, ou se capturam, mesmo que ligeiramente, alguma fagulha da dor eminente desse terceiro andar. E se captam, deixam de lado, rapidamente, seguem exalando a solidez e indiferença dos prédios. Quase que arrogantes, por estarem tão perto das estrelas. Nenhuma proximidade ilusória dos astros os deixam menos irritantes, nem o reflexo dessa lua brilhosa em suas janelas me salva desses dias de tédio. Não tem pra vizinho charmoso que cruzou o olhar com o meu, e me perguntou se por acaso, aqui em casa a gente não viria a ter certo remédio… Absolutamente tudo aqui é um fardo, e saber que essa permanência no pagamento do aluguel é um fato, tornam a mim e meus objetos, meus objetivos, cada vez mais claustrofóbicos. E, cogito a tua visita nesse ambiente, quer dizer, se você, por uma sútil coincidência, passasse aqui durante um dia quente. Se tu por descuido deixasse os teus sentimentos em evidência, se no teu peito houvesse um lugarzinho pra mim rodopiar. Se você acordasse da inebriação dos teus pensamentos e afazeres, e puxasse a minha mão, me fizesse apalpar todo o relevo e inclinações que te moldam, desde o teu primeiro despertar, seja ele místico ou intelectual. Quero ver que gosto tem o que te nutre, e o que te devora a carne. E te ler sem sinopse, ver-te decepcionar todas as minhas hipóteses. Provar sem ter vontade de engolir, o teu lado ruim, enquanto toca a versão mais tosca possível de qualquer coisa que você insiste em chamar de samba. Mas, tudo isso ainda só seria se o sol não resolvesse deixar de bater mais cedo na minha varanda, se a gente tivesse urgentemente que salvar o planeta coreografando uma dança. Se os olhinhos de janela ficassem semicerrados, de levinho, pra ver, curiosamente, a gente namorar.
Se o teu afago desconhecido e a tua presença terna me ajudasse com a mudança de sentimentos, me confortasse com a transição de lugar. Se a minha paisagem não fosse só concreto e cimento, se ainda houvesse um quintal e uma rede, e o teu tempo livre pra tu de mim se ocupar. Quem sabe com essas condições, o tormento cessaria, essa chatice cansaria da minha cara disfarçada, que parece nunca se afetar, e pousaria em outro andar.
E os olhinhos de janela são inúmeros, rodeiam a minha face, mas não sei se percebem nos meus olhos, quais são os olhos que eu quero olhar, ou se capturam, mesmo que ligeiramente, alguma fagulha da dor eminente desse terceiro andar. E se captam, deixam de lado, rapidamente, seguem exalando a solidez e indiferença dos prédios. Quase que arrogantes, por estarem tão perto das estrelas. Nenhuma proximidade ilusória dos astros os deixam menos irritantes, nem o reflexo dessa lua brilhosa em suas janelas me salva desses dias de tédio. Não tem pra vizinho charmoso que cruzou o olhar com o meu, e me perguntou se por acaso, aqui em casa a gente não viria a ter certo remédio… Absolutamente tudo aqui é um fardo, e saber que essa permanência no pagamento do aluguel é um fato, tornam a mim e meus objetos, meus objetivos, cada vez mais claustrofóbicos. E, cogito a tua visita nesse ambiente, quer dizer, se você, por uma sútil coincidência, passasse aqui durante um dia quente. Se tu por descuido deixasse os teus sentimentos em evidência, se no teu peito houvesse um lugarzinho pra mim rodopiar. Se você acordasse da inebriação dos teus pensamentos e afazeres, e puxasse a minha mão, me fizesse apalpar todo o relevo e inclinações que te moldam, desde o teu primeiro despertar, seja ele místico ou intelectual. Quero ver que gosto tem o que te nutre, e o que te devora a carne. E te ler sem sinopse, ver-te decepcionar todas as minhas hipóteses. Provar sem ter vontade de engolir, o teu lado ruim, enquanto toca a versão mais tosca possível de qualquer coisa que você insiste em chamar de samba. Mas, tudo isso ainda só seria se o sol não resolvesse deixar de bater mais cedo na minha varanda, se a gente tivesse urgentemente que salvar o planeta coreografando uma dança. Se os olhinhos de janela ficassem semicerrados, de levinho, pra ver, curiosamente, a gente namorar.
Se o teu afago desconhecido e a tua presença terna me ajudasse com a mudança de sentimentos, me confortasse com a transição de lugar. Se a minha paisagem não fosse só concreto e cimento, se ainda houvesse um quintal e uma rede, e o teu tempo livre pra tu de mim se ocupar. Quem sabe com essas condições, o tormento cessaria, essa chatice cansaria da minha cara disfarçada, que parece nunca se afetar, e pousaria em outro andar.
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