Sophia de Mello Breyner Andresen
Sophia de Mello Breyner Andresen foi uma das mais importantes poetisas portuguesas do século XX. Foi a primeira mulher portuguesa a receber o mais importante galardão literário da língua portuguesa, o Prémio Camões, em 1999.
1919-11-06 Porto
2004-07-02 Lisboa
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Morta
Morta,
Como és clara,
Que frescura ficou entre os teus dedos…
És uma fonte,
Com pedras brancas no fundo,
És uma fonte que de noite canta
E silenciosamente
Vêm peixes de prata à tona de água.
Morta como és clara,
E florida…
És a brisa
Que num gesto de adeus passa nas folhas,
És a brisa que leva os perfumes e os entorna,
És os passos leves da brisa
Quando nas ruas não passa mais ninguém!
És um ramo de tília onde o silêncio floresce,
És um lago onde as imagens se inquietam,
És a secreta nostalgia duma festa
Que nos jardins murmura.
Cantando
Com as mãos deslizando pelos muros
Passas colhendo
O sangue vermelho e maduro das amoras
Vais e vens
Solitária e transparente
E a memória das coisas te acompanha.
Morta como és clara,
E perdida!
És a meia-noite da noite,
És a varanda voltada para o vento,
És uma pena solitária e lisa.
As sombras recomeçam a dançar,
O perfume das algas enche o ar
E as ramagens encostam-se às janelas:
Suaves cabelos de pena tem a brisa.
Sozinha passas no fim das avenidas.
Não mostras o teu rosto,
Passas de costas com um vestido branco.
Como tu és leve e doce como um sono!
O sopro da noite enche-se de angústia
E de mim sobem palavras solitárias:
És o perfume de infância que há nas rochas,
És o vestido de infância que há nos campos,
És a pena de infância que há na noite.
Subitamente
Agarro perco a forma do teu rosto:
Como tu és fresca!
Passas e dos teus dedos correm fontes.
Como tu és leve,
Mais leve que uma dança!
Mal chegaste, mal voltaste, mal te vi
Já no fundo dos caminhos te extinguiste:
Areia lisa e branca que nenhum passo pisa
Pena lisa
Angústia fonte fresca e brisa.
Como és clara,
Que frescura ficou entre os teus dedos…
És uma fonte,
Com pedras brancas no fundo,
És uma fonte que de noite canta
E silenciosamente
Vêm peixes de prata à tona de água.
Morta como és clara,
E florida…
És a brisa
Que num gesto de adeus passa nas folhas,
És a brisa que leva os perfumes e os entorna,
És os passos leves da brisa
Quando nas ruas não passa mais ninguém!
És um ramo de tília onde o silêncio floresce,
És um lago onde as imagens se inquietam,
És a secreta nostalgia duma festa
Que nos jardins murmura.
Cantando
Com as mãos deslizando pelos muros
Passas colhendo
O sangue vermelho e maduro das amoras
Vais e vens
Solitária e transparente
E a memória das coisas te acompanha.
Morta como és clara,
E perdida!
És a meia-noite da noite,
És a varanda voltada para o vento,
És uma pena solitária e lisa.
As sombras recomeçam a dançar,
O perfume das algas enche o ar
E as ramagens encostam-se às janelas:
Suaves cabelos de pena tem a brisa.
Sozinha passas no fim das avenidas.
Não mostras o teu rosto,
Passas de costas com um vestido branco.
Como tu és leve e doce como um sono!
O sopro da noite enche-se de angústia
E de mim sobem palavras solitárias:
És o perfume de infância que há nas rochas,
És o vestido de infância que há nos campos,
És a pena de infância que há na noite.
Subitamente
Agarro perco a forma do teu rosto:
Como tu és fresca!
Passas e dos teus dedos correm fontes.
Como tu és leve,
Mais leve que uma dança!
Mal chegaste, mal voltaste, mal te vi
Já no fundo dos caminhos te extinguiste:
Areia lisa e branca que nenhum passo pisa
Pena lisa
Angústia fonte fresca e brisa.
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