Retrocesso vitral

Às pressas, o cotidiano passa soberano
e cá dentro de nós se presta a trabalhar;
quantas vezes é entanto fadiga apenas - pranto
o crepitar da chama de um bico de gás
que acaba antes de feijão pronto estar?

Ter o que conversar consigo temos todos
embora não nos concedamos ocasião
quando de ouvir internas contraindicações
calamos possível condenação ao céu da boca.

Que íntimo labor custa alpendre e precipício
sobre os quais debruçar e por à prosa vertigem,
alpiste a espalhar aos passarinhos à espreita
que de vegetação humana espera frutos granjear.

Sou acometido de toda sorte de bichos, é verdade
e possibilidade de grilagem faz-se sempre
se me sucedem enchentes à paisagem interior.

Itinerante, a vida surge de repente
em espaçadas tentativas de aproximação sútil
desfere-me uma bofetada à cara
que me acorda de anos inteiros sem dormir.

Dormindo, posso contemplar-me o infinito
ter conversa com o Deus que me permito
exista ou não este eu superior.

Cerro as persianas da vidraça
minha vista embaça a alma
enxergo-me senão desforra.

Veleidades postas à parte
fica do mundo então saudades
dos dias tantas vezes de mim banido.

Eu, este livro de recusa e comunhão
faz-se de assombro e luz
abertas portas ao hospício.

E que desmente insana realidade
seduz e ama a mais disparatada
contraparte, despojada de serviço.

É sapatada essa vida cotidiana
que nos levanta ao deitar-se em nossa cama
recolhendo-se para se cobrir de nosso sonhos
e desesperos, com chute nos traseiros
obrigando-nos a empreitada.

E sempre madrugada, de um maio mês
e noiva - essa hora faceira, cuja aliança
nos cobra , diz que nos ama, e desarma.

Vim ter-lhe com a família, desposar
a sua gente e dela fazer minha consorte

felizmente antes me deteve a enfermidade
a tempo de conhecer-lhe vaidade insã
de astúcia e melindres, ressentimentos.

Nunca me quisera por companheiro
eu que de mim propus casamento
perante um altar que guardei na memória.

Pois daqui vou-me embora
eu que nasci para ser de fevereiro
a aleluia de todo Judas de sorte barata.

Vou-me e será para a glória
de quem se retira dessa terra
e se recolhe em paranoias.

Parto contente e agradecido
os revezes de amigo de muita gente
poucas sérias.

Serão férias para meu ano derradeiro
o primeiro de um terço
que houvera esquecido
e ao relento despertou-me.

Vou com Deus
tarde, é certeza
vou por toda a vida
ser de mim minha comida
café sobremesa.
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