PilotoTribal
Só deixando salvas as sessões de terapia comigo mesmo. Eu, um bloco de notas e um filtro de censura desligado. Desabafos, alguns questionamentos sobre esses desabafos, e encerrando com o trecho de uma música querida que faz sentido no momento.
Se essas paredes falassem
Só a gente mesmo consegue dizer o que se passa quando estamos sozinhos dentro do quarto ou dentro da nossa cabeça. Só a gente conhece nossa própria escuridão.
E intercalando esses momentos de solitude e solidão, a gente fica tentando encaixar peças, como se estivesse em um quebra-cabeça que nunca nos esforçamos o suficiente para terminar. A gente tenta entender contextos e ressignificar sensações. A exaustão, a ansiedade, o desespero dançam em volta da gente como velhos amigos enquanto lutamos pra tentar transformar essa presença em algo um pouco mais aceitável ou um pouco menos destrutivo.
Enquanto tentamos olhar tudo isso "por fora", aquele grito incomoda ainda mais a sua garganta, tentando achar uma rota de fuga pra se libertar daquele nó que ele mesmo criou. Ele é o resultado da nossa cabeça dizendo pra gente: "- não tá bom". Isso é o peito mostrando que talvez, do mesmo jeito que aquele grito não cabia mais dentro da gente, talvez a gente não caiba mais onde estamos nesse momento.
E sair de dentro da nossa cabeça exige uma energia que muitas vezes a gente não tem. E não é porque não quer. É porque toda essa energia foi utilizada por todos os pensamentos intrusivos que ocorriam. As angústias em relação ao passado, ansiedades pelo futuro e todas as incertezas que o presente traz.
Nesse ringue, lutando contra nós mesmos, as vezes já se passaram muitos rounds. O bastante pra energia estar a um passo de se esgotar. E nesse ponto, não existe mais cabeça ou raciocínio, não sai mais nenhum soco ou chute. Até se defender é difícil. A exaustão só deixa o seu coração responder, o resto já está entregue.
Nessa hora temos duas opções: nos deixar nocautear e voltar pra dentro da cabeça, aquele lugar que nos fez dar toda essa volta em vão, ou tentar focar naquilo que seu coração tenta fazer com o restinho de energia que sobrou.
Se a gente cai, só consegue sentir a culpa de estar de volta ao velho percurso, sempre dizendo que vai ser diferente da próxima vez. Talvez repetindo essa mentira várias vezes a gente até se convença disso. Esse looping da destruição infelizmente eu conheço melhor do que eu gostaria. Sempre foi muito mais fácil desistir, e aquele lugar que a gente sabe que é ruim se torna um lar por puro comodismo. E nas paredes cercando a gente, pôsteres dos nossos melhores momentos, aqueles que a gente não se esforça para se repetirem, e garranchos, rabiscos de pedidos de socorro que fizemos nos momentos de mais profundo desespero, na esperança que alguém além de nós mesmos pudesse ler e estender uma mão pra nos tirar dali.
Nesse momento, estou me sentindo como alguém treinando apneia embaixo d'água, e a cada tentativa, consegue aguentar um segundinho a mais. Nesse exato momento, de tanto passar por aquela sensação de ter só um restinho de energia pro coração responder, esse restinho foi mais do que o suficiente. E agora, tal qual a pessoa em apneia, eu tirei a cabeça de dentro d'água e estou tentando processar a novidade. Uma parte de mim me fala pra comemorar esse pequeno avanço, a outra tenta me fazer imergir a cabeça de novo pra tentar "melhorar ainda mais".
Nessa luta, de tanto tomar esse golpe baixo de mim mesmo, acho que o melhor a fazer é tirar as luvas e comemorar o momento.
Reler tudo isso me traz um misto de alívio e estranheza...
Como fiquei ali tanto tempo?
Que cicatrizes esse lugar vai deixar em mim?
Será que vou conseguir parecer normal e convencer todo mundo em volta, mesmo que nesse exato momento eu esteja aqui sozinho, conversando comigo mesmo?
E no fim das contas, será que eu preciso convencer alguém? Onde estavam até agora?
Espero não voltar pra “lá”. Torço para enquanto tiver me curando, essas paredes guardem os segredos que eu escrevi ali. O esforço daqui em diante é para transformar esse período fraqueza em um ponto diminuto no livro final. Uma nota de rodapé, que explica algo realmente importante, mas consegue sintetizar isso em uma frase pequena.
Mas no fim das contas isso não é o livro final. Não é nem a nota de rodapé. É só o som do grito que conseguiu escapar do peito. Se depois dele eu não ficar sem voz, talvez outros apareçam... Ou quem sabe eu consigo silenciar eles com um sorriso?
“Eu tentei pintar na minha cara um sorriso igual àquele que eu sei, está lá, num grão de areia entre as Mostardas e o Pinhal...”
(05/Out/2024)