Joaquim Cardozo
Joaquim Maria Moreira Cardozo foi um engenheiro estrutural, poeta, contista, dramaturgo, professor universitário, tradutor, editor de revistas de arte e arquitetura, desenhista, ilustrador, caricaturista e crítico de arte brasileiro. Era poliglota, conhecedor de cerca de quinze idiomas.
1897-08-26 Recife PE
1978-11-04 Olinda
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Visão do Último Trem Subindo ao Céu
II
As locomotivas na rotunda
Olhavam para a noite do pátio da noite, imóveis, silenciosas
— Molossos deitados, dóceis, esperando: os olhos apagados os
[faróis.
Qual seria, seria, qual dentre elas
A que conduziria aquele trem, aquele que era o trem
E o último seria?
Qual delas ouviria a voz do Senhor?
Quando houve um trilo no ar: uma luz brilhou
No ar noturno — carvão do dia —
E uma dentre todas sentiu, de repente,
O alento do calor;
Alento que se estendeu do fogo,
E que lhe veio em sangue ardente,
Em respiração rumorosa de brancos vapores.
Uma dentre elas
Que era preta, violentamente, luzidia;
Que era preta, vagarosamente preta;
Preta e lentamente e luzidia;
Avançando, transpôs o virador;
E foi!
Foi um touro selvagem a princípio
Depois se fez um boi pesado e manso
Correndo as linhas de trilhos: as fitas, os fios, os trilhos de
[linha.
À sua aproximação as agulhas se abriram —
Porteiras de um curral — furos do espaço, aberturas
Para distâncias possíveis... aberturas, costuras
De rápidas passagens em direções ocultas.
Pouco e pouco, mais pouco, pouco a pouco
Ao trem se atrela, ao trem ligando o engate, os freios
Ajustando... ao trem disposto ao longo
Da plataforma — platimorfa, platibanda, alegrete
Canteiro cultivado — florido de gente.
E logo e depois, justo depois ficou imóvel
À espera, no ante-ritmo da espera
No anseio da esperaesperança:
Harmônicos da espera (intervalo! Vocalises do intervalo).
— Foi assim que se fez a composição daquele trem.
Daquele que era o trem, e o último seria.
Publicado no livro Poesias Completas (1971). Poema composto de onze partes.
In: CARDOZO, Joaquim. Poesias completas. 2.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979. p.124-125
As locomotivas na rotunda
Olhavam para a noite do pátio da noite, imóveis, silenciosas
— Molossos deitados, dóceis, esperando: os olhos apagados os
[faróis.
Qual seria, seria, qual dentre elas
A que conduziria aquele trem, aquele que era o trem
E o último seria?
Qual delas ouviria a voz do Senhor?
Quando houve um trilo no ar: uma luz brilhou
No ar noturno — carvão do dia —
E uma dentre todas sentiu, de repente,
O alento do calor;
Alento que se estendeu do fogo,
E que lhe veio em sangue ardente,
Em respiração rumorosa de brancos vapores.
Uma dentre elas
Que era preta, violentamente, luzidia;
Que era preta, vagarosamente preta;
Preta e lentamente e luzidia;
Avançando, transpôs o virador;
E foi!
Foi um touro selvagem a princípio
Depois se fez um boi pesado e manso
Correndo as linhas de trilhos: as fitas, os fios, os trilhos de
[linha.
À sua aproximação as agulhas se abriram —
Porteiras de um curral — furos do espaço, aberturas
Para distâncias possíveis... aberturas, costuras
De rápidas passagens em direções ocultas.
Pouco e pouco, mais pouco, pouco a pouco
Ao trem se atrela, ao trem ligando o engate, os freios
Ajustando... ao trem disposto ao longo
Da plataforma — platimorfa, platibanda, alegrete
Canteiro cultivado — florido de gente.
E logo e depois, justo depois ficou imóvel
À espera, no ante-ritmo da espera
No anseio da esperaesperança:
Harmônicos da espera (intervalo! Vocalises do intervalo).
— Foi assim que se fez a composição daquele trem.
Daquele que era o trem, e o último seria.
Publicado no livro Poesias Completas (1971). Poema composto de onze partes.
In: CARDOZO, Joaquim. Poesias completas. 2.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979. p.124-125
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