António de Navarro

poeta moçambicano

1902-11-09 Vilar Seco
1980-05-20 Lisboa
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Poema VI

Arvores, folhas, águas, cousas de África,
Deveis ter uma alma, uma força,
Mas eu não vos emocionei ainda
E, — por conseguinte — sou-vos a fuga duma corça.

Deveis ter uma poesia qualquer,
Mas eu apenas sinto a poesia aqui
No homem branco, que a não sente,
Não afeiçoar a natureza a si.

E essa luta de carne força
Contra a força da natureza
É linda, tem beleza,
Mas eu vi há dias numa corça,
Numa pequena gazela,

Que me lambeu os dedos,
A coisa mais bela
Que eu senti — eu que procuro os bruxedos,
As confidências nupciais
Da vida e do meu ser!

Entendemo-nos pouco,
Terras de África — é que eu toco
Instrumento de corda em que os meus nervos são
A matéria e o som, a música e a pauta.
Eu, em suma, toco no coração
Que dou à vida, distraído e sem cauta

Prevenção, e vós requebrai-vos num batuque
Álacre, sim, mas dum som que é como um estuque
Denso e opaco, e a minha casa
Gosto-a mais asa,
Caiada de nuvens naturais, como o acaso indique.

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