Francesca Angiolillo

Francesca Angiolillo

Arquiteta, jornalista, tradutora e poeta.

Niterói
3214
0
0

As jóias da coroa

Como quase toda menina eu queria
ser princesa eu já não era
loura como Cinderela
minha irmã sim e espevitada
chegara ao mundo resolvida
eu não sabia o que fazer
daquela massa castanha
nem lisa nem crespa sobre a cabeça
e acreditava que talvez a cobiçada coroa
de strass
de miss
operasse um pequeno milagre ao encimar
minhas incertezas infantis
então a cada carnaval a cada ida
às lojas de fantasias no centro da cidade
dava-se uma renovada decepção
a diminuta coroa ficava ali
na mesa envidraçada
com seu brilho de mentira

Um dia
numa celebração de aniversário talvez
meu pai nos fez umas coroas
eram de papel cartão preto
adornadas com purpurina no lugar
das pedras e com volutas douradas
feitas a caneta

A caneta era especial
importada só ele usava
e tudo na coroa traía o traço
que era dele totalmente
que era o mesmo
de seus quadros nas paredes
era a marca de sua mão

Eu não sabia quanto aquela coroa
que levei tristemente à minha
cabeça castanha
era real
tão mais real que o diadema prateado
com pequeninas pedras
esquecido na vitrina

No círculo de papel preto
se encerrava o futuro
não o lar imaculado mas a aranha
pequenina se escondendo
num canto do armário
as meias cobrindo os pés
na hora de dormir numa casa
não aquecida
em mais um inverno austral
ao lado de um homem
o herdeiro
mais legítimo
daquela ideia
de príncipe
que fora possível encontrar
e que me dera um descendente
louro de olhos azuis
repetindo no rosto
seus traços castanhos

O cartão escuro era o que fazia
as joias da coroa luzirem mais
178
0


Prémios e Movimentos

FBN 2018

Quem Gosta

Quem Gosta

Seguidores