Gerardo Mello Mourão

Gerardo Mello Mourão

1917-01-08 Ipueiras
2007-03-09 Rio de Janeiro
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Cantor de cântaros

Cantor de cântaros
escande
no cântaro a cantárida do canto
cantaria de cântico
cantor cantar cantata cantaria
canteiro de cantares
ora oleiro
oleiro de canções
à ternura do barro torneava falus
e ao moinho do ventre as raparigas
trituravam cantando o doce oleiro
e o pó, Polymnia, pólen
do oleiro cantador
entre
as violasdas fêmeas
entre
a cintura da terra
pênis de barro
Orfeu de barro
no teu ventre pó, Polymnia, pólen
súbito flor
no cântaro se esconde
e escande
pela pele da Musa pela pedra
canta:
canteiro de cantares
cantaria de espuma labirinto
de âmbar
por terra matinal por mar salgado
por inefável seio
de Lisboa por Goa e Madragoa
e Pero Lopes de Souza
e de seus bagos venho
e ali
e aqui
começa o labirinto de Gerardo.

De Lisboa
por Goa e Madragoa peripécia
de Vasco, Pedro e Manuel
Diogo Cão e Antônio Cão
mais a matilha toda dos mastins do mar
farejavam as águas de onde
morder à tona dos sargaços
lamber
a tua verde mão
terra de aurora
pois te cerca e me cerca
a aurora com suas coisas:
e são coisas da aurora
a estrela morredoura
a nascedoura rosa
e sob o azul azul
do céu o boi mijando
fervoroso no curral
o relincho do cavalo erecto
sobre as ancas da égua
estas são — parece — coisas da aurora
e a aurora é coisa minha.

E era uma vez em Sagres um Infante
e Cristóvão Colombo e Vasco e Pedro
e de uns sabeis e de outros
sabem o mar salgado e os sabedores de água
e ventos velas gáveas caravelas
e quartos dalva e solidões e estrelas:

Martim e Pero
Lopes de Souza e de seus bagos venho
de Lisboa por Goa e Madragoa.

E era uma vez
o teu cantor:
quem sabe deste infante?
a coronha do rifle
o percorrido mapa
e um promontório de ouro
— ó musgos de Isabela —
e esses musgos de fêmea
são coisa minha
só tenho as minhas coisas,
e as minhas coisas são
o cavalo a égua o touro
o bode o rifle esta dama de copas
este gibão de couro
e a rosa que te colho:
e essas coisas trabalho
e também a viola e o mapa-mundi.

Dos outros sabe o mar
mas deste infante sabem
tua cintura fina a farejada flor
a noite a aurora
e essas coisas da aurora coisas minhas
peripécia e
labirinto de Gerardo.

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