Lúcio Cardoso

Lúcio Cardoso

Joaquim Lúcio Cardoso Filho foi um escritor, dramaturgo e poeta brasileiro.

1913-08-14 Curvelo
1968-09-22 Rio de Janeiro
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Alguns Poemas

A Casa do Solteiro

A Pedro Gallotti
(Por oferecimento de Jayme Bastian Pinto)
A casa do solteiro é alta e de paredes de angústia,
muros escorrem como verdes contornos
e colunas de mármore frio guardam seus limites.
Há quatro anjos sentados no teto solene e casto
e com luzes vermelhas, entre ciprestes,
sondam os anjos – guardiões – os fundamentos
que se apóiam com gemidos nos porões e adegas,
no rio escuro e na água morta
de correntes que foram vencidas – despedaçadas.
A casa do solteiro é cor de chama,
de silêncio aflito e aurora sem contemplação.
São pedras de crime e de agonia,
são negras pedras de delírio e de remorso.
São duras estacas de alumínio e febre,
são traves de cristais e de luxúria.
Há um descampado em torno: nostálgicos,
cemitérios se evaporam no crepúsculo
e ruínas de azul e ópio cintilam,
entre guitarras e navalhas abandonadas.
Há flores quentes e de carne, flores mesmas,
cor de whisky, de pêssegos feridos, e raízes
quentes de sofrimento e decomposição.
A casa do solteiro é o sol posto[,]
quando perdemos a fé e o amor se foi,
o começo da noite quando não há horizonte,
a quilha partida e a lança sem gume.
A casa do solteiro se abre como a música,
é triste e macia, fechada como a do príncipe,
fechada, entre janelas longas de ferro,
enquanto lá fora o vento ruge e há relâmpagos.
Não há vertigem, e nem espaço, e nem sossego,
tudo sucede como se morrêssemos aos poucos,
os móveis andam, e nos olhares estranhos,
como róseos desmaios e garras de ultraje.
Se não fossem tão lúcidos, morreriam de cólera,
abraçando manequins de aço, corpos de rampas
em madrugadas de rompimento e viagens.
Esqueceriam as malas – e iriam muito altos,
olhando as hortas onde cresce o mato que assassina.
E estão quietas: jogam as cartas verdes
e suspiram impossíveis paisagens de mar.
Quatro anjos grandes velam no alto do telhado,
com quatro rosas voltadas para o mar,
a mais escura é que os guia. Rosas frias,
de pétalas aguçadas e de mortal traição.
A casa do solteiro é que eles elegeram,
ilha, jangada no silêncio do céu,
vasto navio abandonado e cheio de tormenta,
escândalo e aflição – a casa do solteiro flutua
50 e é como uma vasta cortina de sangue e maldição,
chorando as tardes, os corpos, o coração perdido,
tudo – neste silêncio único onde existe
como uma grande alma sozinha batendo
na infindável noite que não se acaba
e nem se acabará NUNCA,
A CASA DO SOLTEIRO.
Lúcio Cardoso foi um poeta, dramaturgo e prosador brasileiro, nascido em Curvelo, Minas Gerais, a 14 de agosto de 1912. Um dos autores mais importantes surgidos e ativos nas décadas de 30, 40 e 50, ainda que a historiografia literária do país, por muito tempo, tenha relegado à margem o trabalho de escritores como Cardoso, ou ainda Cornélio Penna e Rosário Fusco, por não se enquadrarem na estética hegemônica do período, com o neorrealismo (excelente) dos regionalistas. Seu trabalho mais conhecido é sua prosa, especialmente com a obra-prima Crônica da Casa Assassinada (1959), mas o autor deixou duas coletâneos de poemas, Poesias (1941) e Novas Poesias (1944), além de inéditos mais tarde reunidos em Poemas inéditos (1982). Esta última publicação ocasionou um ensaio interessante de José Paulo Paes sobre o mineiro. Sua obra poética foi reunida em Poesia Completa (São Paulo: Edusp, 2012), com organização de Ésio Macedo Ribeiro, que já havia dedicado um livro ao autor, seu O Riso Escuro ou O Pavão de Luto: Um Percurso pela Poesia de Lúcio Cardoso, lançado pela Nankim. O Diário Completo (1961) de Lúcio Cardoso é também uma leitura fascinante. O escritor mineiro morreu no Rio de Janeiro, a 28 de setembro de 1968.
 
 
"Estranho dom: Deus deu-me todos os sexos."
Lúcio Cardoso, Diário Completo.  
 
 Numa época que prezava (e ainda preza tanto) pela secura e o mito da objetividade pura, as acusações mais frequentes ao trabalho de Lúcio Cardoso são a de uma estilização exagerada em sua linguagem. Em seu belo ensaio "On style", Susan Sontag trata deste desafio crítico, que por vezes acaba por ver uma espécie de desonestidade em trabalhos que transfiguram, em suposta demasia, a realidade pela linguagem, ou que não a tratam de forma que certos críticos e ideólogos quereriam direta, sem filtros. Quando se usa o adjetivo "impressionista" para um grande escritor como Raul Pompeia, por exemplo, sente-se aí o mesmo preconceito - e falácia. Coincidência serem ambos homossexuais, os primeiros autores visíveis abertamente homossexuais da literatura brasileira? Seria tentador recorrer a Sontag aqui, mais uma vez, e pensar no conceito de camp em literatura. Mas isso poderia ser, concordaria, desencaminhador. Eu prefiro pensar na ideia de travestir da linguagem. Para homens e mulheres como Raul Pompeia ou Lúcio Cardoso, muito do que é tido como natural é visto pelo que é para eles: uma construção hegemônica. A realidade, para estes homens e mulheres, vem inevitavelmente tingida de violência psicológica. Daí, a maior violência de linguagem em autores como Pompeia, Cardoso ou, mais recentemente, Roberto Piva. Esta discussão, no Brasil, é perigosa, pois é vista por alguns críticos e ideólogos como mero efeito colateral do politicamente correto, temerosos que são de um possível revisionismo do cânone. Estou tentando tratar disso em um ensaio mais detido sobre o trabalho de Pompeia, Cardoso e Piva.
 
 
 “Montherlant diz — e não pode haver testemunho mais insuspeito —
 que o homossexualismo é 'a própria natureza'. No que tem razão,
 pois no ato de duas pessoas do mesmo sexo se unirem, há um esforço
 da natureza para se realizar até mesmo sem os meios adequados.
 
Lúcio Cardoso, Diário Completo.  
 
 A conversa é complicada, estou ciente disso, já que é certo que outros escritores utilizam esta violência de linguagem por outras causas e consequências. Ma me parece uma conversa mais válida e necessária.
 
--- Ricardo Domeneck
 
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