Manuel da Fonseca

Manuel da Fonseca

Manuel Lopes Fonseca, mais conhecido como Manuel da Fonseca foi um escritor português. Após ter terminado o ensino básico, Manuel da Fonseca prosseguiu os seus estudos em Lisboa.

1911-10-15 Santiago do Cacém
1993-03-11 Lisboa
20889
1
6


Prémios e Movimentos

Neorrealismo

Alguns Poemas

Os olhos do poeta

O poeta tem olhos de água para reflectirem todas as cores do mundo,
e as formas e as proporções exactas, mesmo das coisas que os sábios desconhecem.
Em seu olhar estão as distâncias sem mistério que há entre as estrelas,
e estão as estrelas luzindo na penumbra dos bairros da miséria,
com as silhuetas escuras dos meninos vadios esguedelhados ao vento.
Em seu olhar estão as neves eternas dos Himalaias vencidos
e as rugas maceradas das mães que perderam os filhos na luta entre as pátrias
e o movimento ululante das cidades marítimas onde se falam todas as línguas da terra
e o gesto desolado dos homens que voltam ao lar com as mãos vazias e calejadas
e a luz do deserto incandescente e trémula, e os gestos dos pólos, brancos, brancos,
e a sombra das pálpebras sobre o rosto das noivas que não noivaram
e os tesouros dos oceanos desvendados maravilhando com contos-de-fada à hora da infância
e os trapos negros das mulheres dos pescadores esvoaçando como bandeiras aflitas
e correndo pela costa de mãos jogadas pró mar amaldiçoando a tempestade:
- todas as cores, todas as formas do mundo se agitam e gritam nos olhos do poeta.
Do seu olhar, que é um farol erguido no alto de um promontório,
sai uma estrela voando nas trevas
tocando de esperança o coração dos homens de todas as latitudes.
E os dias claros, inundados de vida, perdem o brilho nos olhos do poeta
que escreve poemas de revolta com tinta de sol na noite de angústia que pesa no mundo.

Ruas da Cidade

Na noite calada e quieta como um grande segredo,
andando ao deus-dará nestas ruas desertas,
saio lá do fundo do meu sonho
e olho ao redor de mim.

Cá fora há tudo o que não é do meu sonho:
o frio, e os altos prédios fechados,
e as ruas mortas como paisagem de cemitérios.

E a claridade fugidia dos candeeiros cansados,
como pálpebras que se vão fechar.
E o torpor saindo de todas as coisas
e pairando no ar, como um desmaio iminente...

Só eu ainda tenho passos para andar
e uma não sei que ternura
para todos que estão, para lá das paredes
adormecidos e descuidados
à morte que espreita escondida no mistério da noite...

Em que casa e andar estará dormindo
aquela de quem não sei o nome nem a vida,
mas descobri a cor dos cabelos e a melodia do corpo
quando nos cruzamos esta manhã?
Nesse momento,
ou fosse porque chovia sol sobre a algazarra de gestos
das gentes que iam e vinham e se falavam e continuavam
ou porque nos olhássemos de certa maneira que não saberei contar,
mesmo de longe, dissemos com os olhos, um para o outro
— Hoje é um dia de glória!
Mas tão estranho me pareceu
aquele milagre entre dois desconhecidos,
que nem voltei a cabeça para trás...
Agora este desânimo sem nome
de quem traiu um dia inteiro de vida
e teima ir pela noite dentro
à espera nem sabe de quê ...

De tantas horas iguais estou farto!

Mas ao fim e sempre a mesma esperança:
"um dia virá..."
E eu que tenho a vida desarrumada
como se fosse um milionário bêbado,
ergo-me e saio para a rua deslumbrado
e ressuscitado, todos os dias, ao amanhecer.
E vai a coisa tão certa como uma religião,
quanto pressinto que me olham de todas as caras
como se espiassem um louco...
Onde estão ouvidos que entendam as minhas falas?

E a noite vem encontrar-me deserto e abandonado...
Ah, um dia, quando a morte chegar,
hei de erguer para ela os meus olhos molhados,
e hei de contar-lhe a indiferença do mundo
e a amargura dos altos sonhos desfeitos...
— assim como um menino fazendo queixas a sua mãe.

Estradas

Não era noite nem dia.
Eram campos campos campos
abertos num sonho quieto.
Eram cabeços redondos
de estevas adormecidas.
E barrancos entre encostas
cheias de azul e silêncio.
Silêncio que se derrama
pela terra escalavrada
e chega no horizonte
suando nuvens de sangue.
Era hora do poente.
Quase noite e quase dia.

E nos campos campos campos
abertos num sonho quieto
sequer os passos de Nena
na branca estrada se ouviam.
Passavam árvores serenas,
nem as ramagens mexiam,
e Nena, pra lá do morro,
na curva desaparecia.

Já de noite que avançava
os longes escureciam.
Já estranhos rumores de folhas
entre as esteveiras andavam,
quando, saindo um atalho,
veio à estrada um vulto esguio.
Tremeram os seios de Nena
sob o corpete justinho.
E uma oliveira amarela
debruçou-se da encosta
com os cabelos caídos!
Não era ladrão de estradas,
nem caminheiro pedinte,
nem nenhum maltês errante.
Era António Valmorim
que estava na sua frente.

— Ó nena de Montes Velhos,
se te quisessem matar
quem te haverá de acudir?

Sob este corpete justinho
uniram-se os seios de Nena.

— Vai te António Valmorim.
Não tenho medo da morte,
só tenho medo de ti.

Mas já noite fechava
a saída dos caminhos.
Já do corpete bordado
os seios de Nena saíam
— como duas flores abertas
por escuras mãos amparadas!
Aí que perfume se eleva
do campo de rosmaninho!
Aí como a boca de Nena
se entreabre fria fria!
Caiu-lhe da mão o saco
junto ao atalho das silvas
e sobre a sua cabeça
o céu de estrelas se abriu!

Ao longe subiu a lua
como um sol inda menino
passeando na charneca…
Caminhos iluminados
eram fios correndo cerros.
Era um grito agudo e alto
que uma estrela cintilou.
Eram cabeços redondos
de estevas surpreendidas.
Eram campos campos campos
abertos de espanto e sonho…

Escritor português, natural de Santiago do Cacém. Iniciou-se em poesia com a publicação de Rosa dos Ventos (1940) e, na ficção, com os contos Aldeia Nova (1942). Ligado ao neo-realismo, evoluíu no sentido de um regionalismo crescente, ligado ao seu Alentejo natal, retratando o povo desta região e a miséria por ele sofrida. Colaborou em jornais e revistas e fez parte do grupo do Novo Cancioneiro. Escreveu, para além das obras acima referidas, os volumes de poesia Planície (1941) e Poemas Completos (1958), os contos O Fogo e as Cinzas (1951) e Um Anjo no Trapézio (1968), e os romances Cerromaior (1943), Seara de Vento (1958, uma das suas obras de maior êxito), e Tempo de Solidão (1973). Da sua colaboração no jornal A Capital surgiram, em 1986, as Crónicas Algarvias. Preparou, ainda, uma Antologia de Fialho de Almeida (1984).
- - - - -
Os Olhos Do Poeta | Poema de Manuel Da Fonseca com narração de Mundo Dos Poemas
Mário Viegas diz Manuel da Fonseca "Domingo" do disco "Pretextos para dizer" (1978)
Antes Que Seja Tarde | Poema De Manuel Lopes Da Fonseca com narração de Mundo Dos Poemas
Entrevista a Manuel da Fonseca – O escritor de Santiago do Cacém
SEMPRE É UMA COMPANHIA, de Manuel da Fonseca
Manuel da Fonseca - Tragédia
MANUEL DA FONSECA - JORGE GANHÃO - CD "Cantar" - 1994
Manuel da Fonseca: Beata viscera
MANUEL DA FONSECA
Tragédia | Poema de Manuel Lopes Fonseca com narração de Mundo Dos Poemas
Manuel da Fonseca - a minha primeira universidade
MANUEL DA FONSECA - JORGE GANHÃO - 1993/2016
JORGE GANHÃO MANUEL DA FONSECA Vagabundo do Mar
JORGE GANHÃO/MANUEL DA FONSECA - "Tejo que levas as àguas" -
Vitorino (canto) & Manuel da Fonseca (diz) - "O Maltês" (Os Malteses)
JORGE GANHÃO & MANUEL DA FONSECA
Poesia Em Manuel da Fonseca
JORGE GANHÃO/MANUEL DA FONSECA- "Vagabundo do Mar" -
Manuel Deodoro da Fonseca - Biografia
Curaelectrica - Estradas (manuel da fonseca)_chunk_1.avi
Poetas Portugueses: Manuel da Fonseca
Poesia em... Manuel da Fonseca
O Vagabundo Do Mar | Poema de Manuel Da Fonseca com narração de Mundo Dos Poemas
Vagabundo do Mar MANUEL DA FONSECA
Maria Campaniça - Manuel da Fonseca por Maria Barroso
AESC a Ler - Vagabundo do Mar, de Manuel da Fonseca, por Guilherme Azevedo
JORGE GANHÃO/MANUEL DA FONSECA - "Vagabundo do Mar" I
Manuel da Fonseca - Antes que seja tarde | Poesia Moderna Ep #10
Jorge Ganhão/Manuel da Fonseca - "Vagabundo do Mar" - Sines
Fonseca - Vine A Buscarte (Video Oficial)
Invité Manuel Da Fonseca / la campagne des régionales en Rhône Alpes
Nacionais de Desporto Escolar - ALENTEJO - Escola Secundária Manuel da Fonseca
JORGE GANHÃO & MANUEL DA FONSECA - «Vagabundo do Mar»
Paulo Ribeiro canta Manuel da Fonseca - Caminhos do Alentejo
Poesia em Manuel da Fonseca
MANUEL DA FONSECA - O LARGO
Manuel da Fonseca, Os felizes
Manuel da Fonseca - 'Antes Que Seja Tarde'
Tim - tejo que levas as águas ( Manuel da Fonseca/Adriano Correia de Oliveira)
Biografia Manoel da Fonseca
Pelos caminhos de Manuel da Fonseca: Paços do Concelho (Parte II)
Retrato de Manuel da Fonseca
Fonseca - Arroyito (Video Oficial)
Centenário do nascimento de Manuel da Fonseca
Fonseca - Eres Mi Sueño
"Garçon", Manuel da Fonseca
Amália nas suas palavras opinião ||entrevista feita por Manuel da Fonseca📚annaintimista
ANECNMF 001 FILARMÓNICa 1º janeiroi castro verde na comemoraçãoNASCIMENTO MANUEL DA FONSECA
anecmnf 032 texto de manuel da fonseca dito por actor no espectáculo ALDEIA NOVA em CASTRO VERDE
7. Mataram a Tuna de Manuel da Fonseca e Contradança I. Registo de Luís Ferreira
Manual da Fonseca
Professor
17/dezembro/2021

Quem Gosta

Seguidores