Reirazinho

Reirazinho

Túneis de pensamentos perdidos.

1999-01-09
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Alguns Poemas

Ressurreição

Eu não irei voltar! Não volto ao refúgio carnal que de seu asilo trancafiou-me. Quase um século de volúpia contra meu prazer, cativando a soberba do ego; décadas de ignomínia sob o solo dos ratos beirando minha masmorra. Bastardos do rei, poderoso rei, vilipendiou-me nas frestas da esperança, quando vosso austero coração derretia conforme o batimento de teu filho queimava na peremptória piedade não atendida. Afogado pelo sangue opressivo que cachoava, infelizmente, meu funesto corpo; o mar vermelho de minhas entranhas banha o sol como a vertigem de marte. O céu, sujo céu, que de seu belo eclesiástico e celeste tom, dava vazão à minha atômica misantropia por cada molécula presente na existência. Como eu sacrilégio o viver, não há amor, muito menos carisma em levantar mais um dia. A fatigada e vil dona morte deveria ceifar minha garganta, espalhar minhas folhas de kalanchoe sobre o vento último da solidão; sobrepujar-me a impotência soberana do fim. Gostaria de ser o fantasmagórico assombro que perturba os moradores de alguma região. Velar o espírito podre dos esotéricos ocultistas, sucumbi-los. A morada da importância balsa a força que tenho em saber que posso matar e morrer ao mesmo tempo; dualidade cartesiana imoral. A bandeira de minha nação é meu próprio crânio, meu brasão é meu corpo putrefato, minha honraria é ter deixado a vida de tantos honrados. Sou aquele que peca sem olhar a quem, sou o renegado ignóbil homem que dança na lama preta de um ritual. Nas trevas habito meu mundo, a desgraça teve que ser assim, o caixão teve que ser minha mansão e meu velório teve de ser meu baile de gala que tanto desejei.

Deus não cabe em um quadro

Deus não cabe em um quadro, muito menos em multiplicidade mística ou religiosa. Hoje sonhei com ele, não era lá como teurgias e artes eclesiásticas da renascença. Um monstro, digno de terror lovecraftiano, com voz gutural falando em semântica desconhecida; algo como Penderecki orquestrava majestosamente bem em seus concertos. Saiu de uma parede como um ectoplasma, ironicamente de uma igreja católica. Regurgitei sua existência em meio cristão, porém, ainda sim, é miúdo comparado a sua essência, por isso, Deus não cabe em caixinhas. O Criador, inefável monte cósmico, permanece fora e dentro do amor, no máximo isso, uma pane-existência que mais faz sentido, diferente de sua manifestação dada pelos humanos; o homem tentou entender, mas falhou e ainda persiste em falhar, porque O Verbo não pode se ofender com palavras mundanas, é cômico a blasfêmia ser um problema. A linguagem é uma simplificação complexificada que permite utilizar uma parte da interatividade cerebral, construir-reconstruir uma nova complexidade discursiva e assim dialogar com a estrutura do real. O Todo Poderoso seria a quintessência da mesquinhez se assim o fosse, mais stricto sensu do que uma norma jurídica. Ele é maior que a psicologização filosófica que faço agora, um mero humano compreendendo a hipertotalidade do Absoluto; a nossa forma de ajuizá-lo é uma lógica a priori advinda da razão limitada, não só pela lógica em si, mas pela delimitação histórica de determinada época. O Absoluto inexiste, apercebido, inconcebível, e isso não é um problema. Deus no máximo é anuente: nós o permitimos ser o que ele é.
 
 
 
 
 
 
 

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