Ser Nada
Os raios de luz irrompem pela janela,
Invadindo-me o quarto:
Beijando as minhas pálpebras,
Saudando-me o rosto,
Aviso de que começa novo dia…
Misto de perfume de outono.
Estore acima,
Escadas abaixo.
Escorregando pelos degraus,
Chama-me o burburinho da avenida.
Sigo sempre em frente, ao fundo virar à esquerda,
Peço o croissant fresco e caminho para o miradouro.
Sento-me no mesmo banco todos os dias,
Pego na mesma caneta, nova folha de papel.
Receio ter que a juntar à resma de folhas na secretária,
Que, embora usadas, permanecem em branco.
Trazer uma folha nova todos os dias serve-me de consolo,
Mesmo não tendo nada para escrever nelas.
Chegam em branco, partem em branco, com leves vincos ou manchas de desespero.
Já não escrevia há muito…
Pensava em ser poeta, pensava em escrever poemas.
A chuva começa a cair.
Ecoa o som das gotas que embatem nas folhas das árvores.
Há um vento confortável e desconcertante, que me provoca arrepios e me abraça na solidão.
Acaricia-me a água o rosto, lavando-me o espírito de confusão.
Ao fundo, névoa encobre a serra. Vejo agora nada mais, nada menos, que a minha existência confrontada com o nada.
Vem até mim uma onda de nostalgia e, por instantes, o silêncio instala-se.
O meu corpo quis a cama, as minhas pálpebras quiseram os beijos do sol, o meu nariz quis o perfume de outono, os meus ouvidos quiseram o burburinho da avenida, a minha boca quis outro croissant e a minha alma quis que começasse outro dia:
Queria outra folha de papel.
Ali estava, diante de mim, eu própria.
Finalmente, levava uma folha preenchida para casa.
Encharcada, em branco, amassada. Contudo, é o testemunho daquilo que vi hoje. Vazio.
De volta a casa,
Escadas acima,
Estore abaixo,
Repousei no chão molhado o meu peso.
Olhar fixo no teto, feixes de luz atravessando a água presa nas pestanas, lâmpada acabada de fundir. Vi poesia.
A poesia está no todo, e os poetas são a parte do todo
Que põe o todo no papel.
Ser poeta.
Ser poesia.
Ser nada.
Invadindo-me o quarto:
Beijando as minhas pálpebras,
Saudando-me o rosto,
Aviso de que começa novo dia…
Misto de perfume de outono.
Estore acima,
Escadas abaixo.
Escorregando pelos degraus,
Chama-me o burburinho da avenida.
Sigo sempre em frente, ao fundo virar à esquerda,
Peço o croissant fresco e caminho para o miradouro.
Sento-me no mesmo banco todos os dias,
Pego na mesma caneta, nova folha de papel.
Receio ter que a juntar à resma de folhas na secretária,
Que, embora usadas, permanecem em branco.
Trazer uma folha nova todos os dias serve-me de consolo,
Mesmo não tendo nada para escrever nelas.
Chegam em branco, partem em branco, com leves vincos ou manchas de desespero.
Já não escrevia há muito…
Pensava em ser poeta, pensava em escrever poemas.
A chuva começa a cair.
Ecoa o som das gotas que embatem nas folhas das árvores.
Há um vento confortável e desconcertante, que me provoca arrepios e me abraça na solidão.
Acaricia-me a água o rosto, lavando-me o espírito de confusão.
Ao fundo, névoa encobre a serra. Vejo agora nada mais, nada menos, que a minha existência confrontada com o nada.
Vem até mim uma onda de nostalgia e, por instantes, o silêncio instala-se.
O meu corpo quis a cama, as minhas pálpebras quiseram os beijos do sol, o meu nariz quis o perfume de outono, os meus ouvidos quiseram o burburinho da avenida, a minha boca quis outro croissant e a minha alma quis que começasse outro dia:
Queria outra folha de papel.
Ali estava, diante de mim, eu própria.
Finalmente, levava uma folha preenchida para casa.
Encharcada, em branco, amassada. Contudo, é o testemunho daquilo que vi hoje. Vazio.
De volta a casa,
Escadas acima,
Estore abaixo,
Repousei no chão molhado o meu peso.
Olhar fixo no teto, feixes de luz atravessando a água presa nas pestanas, lâmpada acabada de fundir. Vi poesia.
A poesia está no todo, e os poetas são a parte do todo
Que põe o todo no papel.
Ser poeta.
Ser poesia.
Ser nada.
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