Cruz e Sousa
João da Cruz e Sousa foi um poeta brasileiro. Com a alcunha de Dante Negro ou Cisne Negro, foi um dos precursores do simbolismo no Brasil.
1861-11-24 Desterro, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil
1898-03-19 Sítio, Brasil
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Pressago
Nas águas daquele lago
Dormita a sombra de Iago...
Um véu de luar funéreo
Cobre tudo de mistério...
Há um lívido abandono
Do luar no estranho sono.
Transfiguração enorme
Encobre o luar que dorme...
Dá meia-noite na ermida,
Como o último ai de uma vida.
São badaladas nevoentas,
Sonolentas, sonolentas...
Do céu no estrelado luxo
Passa o fantasma de um bruxo.
No mar tenebroso e tetro
Vaga de um náufrago o espectro.
Como fantásticos signos,
Erram demônios malignos.
Na brancura das ossadas
Gemem as almas penadas.
Lobisomens, feiticeiras
Gargalham no luar das eiras.
Os vultos dos enforcados
Uivam nos ventos irados.
Os sinos das torres frias
Soluçam hipocondrias.
Luxúrias de virgens mortas
Das tumbas rasgam as portas.
Andam torvos pesadelos
Arrepiando os cabelos.
Coalha nos lodos abjetos
O sangue roxo dos fetos.
Há rios maus, amarelos
De presságio de flagelos.
Das vesgas concupiscências
Saem vis fosforescências.
Os remorsos contorcidos
Mordem os ares pungidos.
A alma cobarde de Judas
Recebe expressões cornudas.
Negras aves de rapina
Mostram a garra assassina.
Sob o céu que nos oprime
Languescem formas de crime.
Com os mais sinistros furores,
Saem gemidos das flores.
Caveiras! Que horror medonho!
Parecem visões de um sonho!
A morte com Sancho Pança,
Grotesca e trágica dança.
E como um símbolo eterno,
Ritmos dos Ritmos do inferno.
No lago morto, ondulando,
Dentre o luar noctivagando,
O corvo hediondo crocita
Da sombra d’Iago maldita!
Publicado no livro Faróis (1900).
In: SOUSA, Cruz e. Poesia completa. Introd. Maria Helena Camargo Régis. Florianópolis: Fundação Catarinenses de Cultura, 1985. p.73-75
Dormita a sombra de Iago...
Um véu de luar funéreo
Cobre tudo de mistério...
Há um lívido abandono
Do luar no estranho sono.
Transfiguração enorme
Encobre o luar que dorme...
Dá meia-noite na ermida,
Como o último ai de uma vida.
São badaladas nevoentas,
Sonolentas, sonolentas...
Do céu no estrelado luxo
Passa o fantasma de um bruxo.
No mar tenebroso e tetro
Vaga de um náufrago o espectro.
Como fantásticos signos,
Erram demônios malignos.
Na brancura das ossadas
Gemem as almas penadas.
Lobisomens, feiticeiras
Gargalham no luar das eiras.
Os vultos dos enforcados
Uivam nos ventos irados.
Os sinos das torres frias
Soluçam hipocondrias.
Luxúrias de virgens mortas
Das tumbas rasgam as portas.
Andam torvos pesadelos
Arrepiando os cabelos.
Coalha nos lodos abjetos
O sangue roxo dos fetos.
Há rios maus, amarelos
De presságio de flagelos.
Das vesgas concupiscências
Saem vis fosforescências.
Os remorsos contorcidos
Mordem os ares pungidos.
A alma cobarde de Judas
Recebe expressões cornudas.
Negras aves de rapina
Mostram a garra assassina.
Sob o céu que nos oprime
Languescem formas de crime.
Com os mais sinistros furores,
Saem gemidos das flores.
Caveiras! Que horror medonho!
Parecem visões de um sonho!
A morte com Sancho Pança,
Grotesca e trágica dança.
E como um símbolo eterno,
Ritmos dos Ritmos do inferno.
No lago morto, ondulando,
Dentre o luar noctivagando,
O corvo hediondo crocita
Da sombra d’Iago maldita!
Publicado no livro Faróis (1900).
In: SOUSA, Cruz e. Poesia completa. Introd. Maria Helena Camargo Régis. Florianópolis: Fundação Catarinenses de Cultura, 1985. p.73-75
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