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As pessoas parecem flores finalmente

1994

Charles Bukowski

Charles Bukowski

poeta, contista e romancista estadunidense

1920-08-16 Andernach
1994-03-09 San Pedro
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Beijando-me e Levando-me Para Longe

ela sempre estava pensando naquilo
e era jovem e linda e
todos os meus amigos tinham ciúme:
o que um velho fodido como eu
estava fazendo com uma garota como
ela?
ela sempre estava pensando
naquilo.
íamos de carro por aí e
ela dizia, "está vendo aquele
lugarzinho? estacione ali."
eu mal conseguia estacionar e
ela já estava agachada em mim.
uma vez eu a levei de carro ao Arizona
e no meio do caminho
tarde da noite
após o café e rosquinhas
em um boteco aberto a noite toda
ela se agachou
e começou
enquanto eu navegava pelas
curvas escuras através das
colinas baixas
e enquanto eu ia dirigindo
isso a inspirou a
novas altitudes.
outra vez
em L.A.
havíamos comprado cachorros-quente e coca
e fritas e estávamos comendo no
Griffith Park
famílias lá
crianças brincando
e ela me abriu o zíper
e começou.
"que diabo você está fazendo?"
eu lhe perguntei.
mais tarde
quando eu lhe perguntei
por que
na frente de todo mundo
ela me disse que era
perigoso e empolgante
desse jeito.
ela me perguntou uma
vez "por que eu estou ficando com
um velho como você
de qualquer modo?"
"para que você possa me fazer
boquetes?", eu respondi.
"eu odeio esse termo!", ela
disse.
"chupando meu pau", eu
sugeri.
"eu odeio esse termo
também!", ela disse.
"o que você preferiria?",
eu perguntei.
"eu gosto de pensar que
eu o estou "beijando e levando para longe"",
ela disse.
"tudo bem", eu disse.
era como qualquer outro
relacionamento, havia
ciúmes de ambas as partes,
havia separações e
reconciliações.
havia também fragmentos de momentos de
grande paz e beleza.
tentei afastar-me dela várias vezes e
ela tentou afastar-se de mim
mas era difícil:
Cupido, com seu jeito estranho, realmente
estava lá.
sempre que eu tinha que sair da cidade
ela me beijava em despedida.
bom
umas noites na
espera
garantindo a minha
fidelidade.
então tudo o que
eu tinha que fazer era
preocupar-me com
ela.
quando ela não estava
me beijando e levando para longe
também achávamos tempo
para fazer aquilo
de vários outros jeitos
estranhos.
mas todo aquele tempo com ela
era na maior parte só
ser chupado ou
esperar para sê-lo.
nós nunca pensávamos muito em
outras coisas.
nós nunca íamos ao
cinema (que de qualquer modo
eu odiava).
nunca saíamos para
comer fora.
não tínhamos curiosidade
sobre
assuntos do mundo.
nós apenas passávamos nosso tempo
estacionados em
lugares isolados ou áreas
de piquenique ou
dirigindo por escuras
rodovias para o Novo México,
Nevada e Utah.
ou
quando estávamos em sua grande cama
de carvalho
com a face para o sul
tanto do restante do
tempo
que eu memorizei
cada vinco nos
lençóis
e especialmente
todas as rachaduras no
forro.
eu costumava fazer jogos com
ela sobre aquele forro.
"você vê essas rachaduras aí
em cima?"
"onde?"
"veja para onde eu estou apontando..."
"está bem?
"agora, vê essas rachaduras, vê o
formato? forma uma imagem. você vê
o que é?º
"hummm, hummm..."
"vamos, o que é?"
"eu sei! é um homem em cima de uma
mulher!"
"errado. é um flamingo parado
junto de um riacho."
finalmente nos livramos
um do outro.
é triste mas é
a operação-padrão
(fico sempre confuso pela
falta de durabilidade em assuntos
humanos).
suponho que a partida foi
infeliz
talvez até feia.
passaram-se 3 ou 4
anos agora
e eu me pergunto se ela
alguma vez pensa
em mim, no que estou
fazendo
é claro, eu sei o que ela está
fazendo.
e ela o fazia melhor
do que qualquer outra
que conheci.
e acho que isso merece este
poema, quem sabe.
se não, pelo menos uma
nota de rodapé: que tais casos não
são sem alegria e humor para os dois
lados
e enquanto Saigon e os tanques inimigos se
misturam em velhos sonhos
enquanto cães velhos e enfermos são
mortos atravessando estradas
enquanto a ponte levadiça se ergue para
deixar os pescadores bêbados partirem
para o mar
não foi por nada
que
ela estava pensando
naquilo
o tempo
todo.
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Depois De Receber Um Exemplar De Um Editor Contribuinte

cavilosos peixinhos
mordiscando suas feridas
achadas nessas páginas mal impressas
e ainda à procura de patrocinadores
amantes
mães
fama fácil:
qual de vocês
eu vi através de uma
janela de restaurante em uma Denver gelada
comendo torta de maçãs?
dirigindo para East Hollywood com um mastim
à caça de sua ama de leite?
qual de vocês então bateu
à minha porta
querendo falar sobre POESIA?
qual de vocês é vaidoso o bastante
e miserável o bastante
e doente o bastante
para chupar o rabo de um editor?
qual de vocês vai
a todas as festinhas bacanas
e lê suas coisas para os
vermes?
qual de vocês acha
que é Pound, ou Shelley
em uma borboleta azul?
qual de vocês
modificou meu poema para lê-lo
da maneira que você PENSA
que um poema deve ser lido?
qual de vocês esgoelou
sentimentos doentios e amigáveis
como larvas rastejando no
corpo da minha mente?
e isso pode parecer forte
e injusto,
pois eu digo, deixem que todos vivam
e escrevam
se quiserem viver e escrever
mas qual de vocês
vive com sua mãe ou sua tia,
qual de vocês aplica
primeiro talco em sua bunda
e depois sobe
na cruz?
qual de vocês
(um deles um professor universitário
a quem certa vez eu castiguei
por causa de abstração sem sentido)
qual de vocês agora
escreve sobre putas e bebida
e nunca foi para a cama com uma mulher,
e nunca bebeu
mais que um copo de cerveja escura?
e qual de vocês
escreve com um dicionário sobre a barriga
como se sodomizasse uma vaca inteira?
qual de vocês faz sua alma rebolar
ao som de Bach para órgão
como um macaco em uma corda?
qual de vocês
odeia a mulher que o alimenta?
não por ela ser humana
mas porque
ela não gosta do que você faz.
qual de vocês
não conseguiria rebater uma bola de beisebol?
qual de vocês
nunca esteve na cadeia?
qual de vocês?
qual de vocês?
qual de
vocês?
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O Ódio a Hemingway

dei ao último livro de Hemingway
As ilhas da corrente
uma resenha ruim
enquanto a maioria dos outros lhe dava
boas resenhas.
mas o ódio a Hemingway
pelo escritor malsucedido
especialmente a mulher escritora
é incompreensível para mim.
essa mulher escritora malsucedida estava enfurecida.
tentei explicar porque achava que
Hemingway escrevia
desse modo.
essa coisa de vida-através-da-morte, ela disse,
absolutamente não é exclusiva de
Hemingway. do que mais toda
a nossa cultura ocidental trata? é a mesma história
mais uma vez e mais
uma vez. nada de novo
aqui!
é verdade, pensei, mas...
atirar em leões significava apenas atirar
em si mesmo? ela perguntou. é isso? é
isso? não quando esses leões estavam desarmados e
ele chegava neles com um rifle e
nem mesmo precisava
chegar perto. realmente! pobrezinho do Heming-
way.
é verdade, pensei, os leões não levam
rifles.
a tradição espanhola. entendo Goya porque ele consegue
ser tão real e completo, ela disse. não entendo
Hemingway como outra coisa a não ser um velho filme de Hollywood
protagonizado por... qual é o nome dele? aquele Cooper que era amigo
dele - aquele cara do Matar ou morrer. uau!
ela não gosta nem mesmo dos amigos dele,
pensei.
você aprende sobre a morte por morrer
não por olhá-la,
ela disse.
isso é verdade, pensei, mas então
como você escreve sobre isso?
você diz que Shakespeare o aborrece, ela disse -
o fato é
que ele sabia muito mais que Hemingway -
Hemingway nunca foi além de ser um
jornalista.
que aprendeu a escrever com Gertrude Stein, pensei.
ele lhe contava o que via, ela disse, mas ele não sabia
o que significava - como as coisas realmente
se relacionam... ele nunca
explicou.
estranho, pensei, era exatamente isso que eu
gostava
nele.
você fala um monte de típica
besteira, ela disse.
que pena, pensei,
ela tem pernas tão lindas
e longas. bem, Goya também tinha razão,
mas você não pode ir para a cama com
Goya.
bem, tudo certo, eu pensei, Hemingway puxou aqueles peixes grandes
para fora do mar e encarou algumas guerras
e assistiu a touros morrerem e atirou em alguns
leões;
escreveu alguns grandes contos
e nos deu 2 ou 3
bons romances
iniciais;
em seu derradeiro dia
Hemingway acenou para
alguns garotos indo para a escola,
eles acenaram de volta, e ele nunca tocou o suco de laranja
à sua frente;
então ele enfiou aquela arma em sua boca como um canudinho
e apertou o gatilho
e um dos poucos imortais da América
era sangue e miolos pelas paredes e pelo
forro da sala, e então todos eles sorriram,
eles sorriram e disseram,
ah, um fresco! ah, um covarde!
sim, ele se aproveitou de McAlmon,
ele se aproveitou de todo mundo
e não tratou Fitzgerald corretamente
e ele datilografava em pé
e uma vez ele esteve em um
hospício,
e Gertie Stein, aquele
canhão,
talvez ela o tivesse
ensinado a
escrever.
mas quem o convenceu de que era hora de morrer?
vocês fizeram isso, vocês
seus bundões
sujos.
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Olhando Para Os Colhões Do Gato

sentado aqui junto à janela
suando suor de cerveja
atormentado pelo verão
estou olhando para os colhões do meu gato.
não é por minha escolha.
ele dorme em uma velha cadeira de balanço
na varanda
e dali ele me olha
dependurado em seus colhões de gato.
aí está seu rabo, coisa danada,
dependurada de lado
de modo que eu possa
ver seus felpudos reservatórios mas
em que pode um homem pensar
enquanto olha para as bolas de um gato?
certamente não sobre a nave naufragada após uma
grande batalha naval.
certamente não sobre um programa para salvar os
pobres.
certamente não sobre um mercado de flores ou uma dúzia de
OVOS.
certamente não sobre um interruptor de luz quebrado.
colhões são colhões, é isso aí,
e com muita certeza isso é verdade a respeito
dos colhões de um gato.
os meus são bem moles e macios e
diz-me minha atual mulher
bem grandes:
"você tem colhões enormes, Chinaski!"
mas os colhões do gato:
eu não consigo entender se ele está dependurado neles
ou se eles estão dependurados nele.
você vê, há essa batalha de atravessar quase toda a noite
pela fêmea
e isso não é nada fácil para nenhum de nós.
veja:
falta um pedaço da sua orelha esquerda.
certa vez pensei que um de seus olhos tinha sido
arrancado
mas quando o sangue seco
descascou
uma semana depois
aí estava seu puro
olho verde-dourado
me encarando.
todo o seu corpo está coberto de escaras de mordidas
e no outro dia,
tentando acariciar sua cabeça
ele gemeu e quase me mordeu -
a pele do seu crânio
havia sido rasgada até o osso.
com certeza não é fácil para nenhum de nós,
pobre coitado.
ele dorme
e agora sonha
o quê?
um gordo pardal em sua boca?
ou rodeado por gatas com tesão?
ele sonha seus sonhos diurnos
e nós saberemos o que é
esta noite.
boa sorte, velho camarada,
a vida não é fácil,
estamos dependurados em nossos colhões, é assim que estamos, ou seja,
estamos no cativeiro de nossos colhões,
e eu deveria me conter um pouco
quando se trata de mulheres.
enquanto isso
olharei seus olhos e me defenderei com jabs de esquerda
e correrei como do diabo
quando nada mais
adiantar.
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Sobre Latas De Cerveja E Embalagens De Açúcar

o boi, eu,
eu estou com frio esta noite
esta manhã
as 4 da madrugada
só com uma lata de cerveja e 2
charutos;
mulher e criança saindo
quarta-feira;
o rádio toca uma ária escocesa e
o velho aquecedor solta
gás, gás, gás,
se eu apenas conseguisse dormir.
eu não consigo dormir.
a morte nem sempre chega como uma bomba
ou uma puta gorda
às vezes a morte rasteja polegada a polegada
como uma pequena aranha rastejando na sua barriga
enquanto você
dorme.
isso não é novidade para você,
eu sei.
as mãos do meu esqueleto rezam esta noite
rezam por algo
não sei
o quê.
minhas mãos seguram este charuto
sobre meu sonho
esvaziado.
eu sou
meio que uma piada suja
contada vezes demais contada tarde demais
quando as pessoas não conseguem mais
rir.
há uma embalagem na mesa.
leio seu rótulo, diz:
medidas de açúcar: 1 libra de pó igual a
4 e 1/2 xícaras coadas; 1 libra granulada igual a
2 e 1/2 xícaras etc.
agora, aí está um novo mundo! eu fico sentado e olho de soslaio a caixa,
esquecendo de tudo:
General Grant
sopa de ervilhas
etc.
o boi, eu, estou com frio esta noite.
amanhã vou à mercearia arrumar embalagens de cartolina vazias
para que eles possam empacotar suas
coisas. a mulher guarda toda espécie de cartas, retalhos,
fotografias. a garotinha, é claro, tem seus
brinquedos de garotinha.
preciso de mais para ler. leio minha lata de cerveja. diz:
fermentada com água pura de fonte da primavera de Rocky Mountain
que se converte em mijo; fermentada da carne que
se converte em repasto para vermes;
fermentada com amor que se converte em nada; minha terra e
sua terra; meu túmulo e seu túmulo; um gosto de
mel; um sonho de uma noite de ouro; eu vim por esse caminho por
um tempo e depois parti: fermentado, ferrado,
emprestado, cedido e mentido em nome da
Vida.
eu tomo essa cerveja.
paguei por
ela.
agora são 5:30 da manhã e muita gente fodeu e
dormiu e agora está saindo de seus pequenos sonhos enquanto
o homem no rádio pergunta se eu quero dinheiro emprestado por
minha casa.
consigo dormir com isso. consigo dormir pensando que
quem sabe na próxima vez em que houver tumultos nas ruas
quem sabe eles me deixem participar
mesmo minha pele sendo da cor errada
e enquanto eles estão lutando por Cadillacs e
TVs a cores
eu estarei lutando por outra coisa -
para quê
neste momento
não está claro para
mim.
mas pode ser que quando eu despertar tudo isso esteja claro
neste momento
é terminar o charuto
esperar pela mercearia abrir e
trocar esses shorts
sujos.
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Pague Seu Aluguel Ou Saia

em algum lugar a princesa morta
dorme com um novo amante;
só tenho alguns pacotes vazios de tocos
de cigarro que sobraram
pescados de volta pelas redes de anseios
mas tudo está bem
exceto a cor e a conduta
da abelha,
a cera demasiado vermelha
e um bilhete da mulher
na colina
que compra meus quadros:
"preocupada com você. ligue-
-me. amor. R.",
e outro bilhete sob a
porta:
"pague seu aluguel ou saia".
o aquecedor está ligado e
há um pote de pura pimenta
em pó a encarar-me,
e papel para datilografar
para preencher com poemas;
tudo está bem,
calçadas ecoam os cliques dos
saltos,
motores dão partida,
e eu tenho que lavar essas malditas
xícaras rachadas de café;
e eu me pergunto: como vai você hoje, meu
amigo?
como você está? desapontado?
infeliz?
eu? é duro. duro como um
bom poema.
mas eu me sinto muito bem,
e realmente,
essencialmente, daqui a pouco eu
vou comer
ou picadinho ou ensopado, qualquer coisa
de dentro de uma lata.
eu também poderei fazer levantamento de pesos e
espero
continuar me sentindo legal, embora meu
rádio esteja chiando
e fale de besteiras como
bons serviços de jatos;
agora são 7:30, e esse é
o jeito de homens
viverem e morrerem: não o jeito de Eliot
mas
meu jeito, nosso jeito,
quietos como uma asa fechada,
ódio queimado como em uma chaminé;
os lençóis baixando
rasgados pelo tempo
e à minha direita há uma faca que
não cortaria nem mesmo uma cebola
mas eu não tenho nenhuma cebola para
cortar, e
eu espero que você também
esteja se sentindo bem.
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O Porco na Cerca

você sabe, dirigindo através desta cidade ou de qualquer cidade
caminhando através desta cidade ou de qualquer cidade vejo
gente com narinas, dedos, pés,
olhos, boca, ouvido, queixo, sobrancelhas e assim por diante.
entro em uma lanchonete e peço o desjejum,
olho ao redor e estou consciente de crânios e esquele-
tos enquanto observo um homem enfiar
um pedaço de bacon em sua boca e morrer um pouco
e não gosto de contemplar a morte porque
pode haver algum outro lugar aonde tenhamos que ir depois
e já encarei confusões o bastante só por estar bem aqui
mas
talvez seja a culpa de todas as cobras em viveiros de vidro,
elas não podem mover-se, respirar ou matar e eles
deveriam soltá-las e eles deveriam esvaziar as
prisões também assim que eu arrumar minha Luger[1] e
soltar meus cachorros.
os prédios são todos pobremente construídos e o corpo
humano também; às vezes assisto a dançarinas dando pulos
por aí e penso, isso é feio e desajeitado,
o corpo humano foi construído de modo errado, é desengonçado e
estúpido... comparado a quê? comparado ao cacto
e ao leopardo. bem,
minhas mulheres sempre me disseram, "você é tão negativo!"
e eu olhava para elas e respondia, "eu acho que a reali-
dade é negativa". comparada a quê? irrealidade.
no entanto mesmo assim tive mais alegrias que qualquer um
deles, eles foram positivos e deprimidos, e eu sou negativo
e feliz. bem,
tudo isso pode ser culpa de bombeiros parados esperando
por um incêndio. pode ser culpa de algum cara em Moscou
estuprando uma menina de
6 anos, ou pode ser porque a neblina não é
mais a neblina do jeito como costumava ser - fresca, molhada,
refrescante,
mas tudo está machucando agora. eles acharam algum cara jogando
futebol na U.C.L.A. que nem sabia ler ou escrever
mas por Cristo como ele tinha força, que corpo, ele podia ter se dado
bem mas ele se aborreceu e matou seu fornecedor
de drogas e depois descobriram que ao final das contas ele nem era
muito um universitário, só uma espécie de peixinho dourado criado
o que me lembra
dificilmente mais alguém cria peixes dourados: você sabe quando eu
era criança, um domicílio em cada 3 tinha peixes dourados.
o que aconteceu com eles? alguns tinham até
laguinhos de peixes dourados no quintal com um fino musgo e
dúzias de peixes dourados, pequenos, médios, grandes,
viviam de migalhas de pão e alguns desses fodões se tornaram
tão gordos e estúpidos que simplesmente subiram até a superfície e se
deitaram
de lado, um olho para o sol, largados, como uma má mensagem
de Deus, mas as pessoas também desistem quando não deviam.
certa vez
houve um campeão, recebeu 5 milhões por uma disputa de campeonato,
o Macho Man, nunca havia sido derrotado mas deu de cara com
um sujeito que podia enfrentá-lo e depois de uns rounds ele
deu as costas e disse,
"no más".
imagine só, por 5 milhões um homem poderia aguentar alguma
dor, eu vi homens com suas vidas inteiras destruídas por
55 centavos a hora ou menos.
bem,
talvez seja a alvenaria ou talvez seja a bomba d'água, ou talvez seja o
porco na cerca, ou talvez seja o fim da sorte. anjos estão voando
baixo hoje com asas em chamas, sua mãe é a vítima de
seus pesadelos ordinários enquanto 40 torneiras gotejam, o gato está com
leucemia, faltam só 245 dias até o Natal e meu
protético me odeia.
assim agora
eu acordo com o pescoço duro em vez do pau
duro e
você
sempre poderá me achar aqui
em East Hollywood mas
por favor por favor por favor
não
tente.
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Nunca Trago Minha Mulher

estaciono, saio, tranco o carro, é um dia perfeito, calmo
e agradável. eu me sinto bem, começo a caminhar em direção à
entrada e um gordinho se junta a mim. ele caminha a meu lado.
não sei de onde saiu.
"oi", ele diz, "como vai você?"
"tudo bem", eu digo.
ele diz, "acho que você não se lembra de mim. você me viu
talvez duas ou três vezes".
"pode ser", eu digo. "venho às pistas todo dia."
"eu venho talvez três ou quatro vezes por mês", ele diz.
"com sua mulher?", eu pergunto.
"oh, não", ele diz, "nunca trago minha mulher."
"qual você prefere para a ponta?", ele pergunta.
eu lhe digo que ainda não comprei meu boletim do turfe.
seguimos e eu ando mais depressa. ele se esforça para me acompanhar.
"onde você fica?", ele pergunta.
eu lhe digo que fico em diversos lugares.
"esse maldito Gilligan", ele diz, "é o pior
jóquei aqui. eu perdi uma nota nele o outro dia. por que
eles o usam?"
eu digo a ele que Whittingham e Longden acham que está tudo certo
com ele.
"com certeza, eles são amigos", ele responde. "sei alguma coisa sobre
Gillingan. quer saber?"
eu lhe digo para esquecer.
estamos chegando perto da banca de jornal junto da entrada
e me viro na direção dela como se fosse comprar
um jornal.
"boa sorte", eu digo e desvio.
ele parece perplexo. seus olhos parecem chocados. ele me lembra
uma mulher que só se sente segura quando o polegar de alguém está
em seu rabo.
ele olha ao redor, acha um homem de cabelo grisalho que
manca, apressa-se, alcança o velho e começa
a conversar com ele.
compro meu ingresso, acho um lugar longe de todo mundo, sento.
tenho sete ou oito bons minutos sossegados, então escuto um
movimento: um cara senta-se perto de mim, não a meu
lado mas a um assento de distância embora haja centenas de
assentos vazios.
outro Mickey Mouse, eu penso. por que será que eles sempre me
acham?
continuo a fazer meus cálculos.
então ouço a voz dele: "Blue Baron vai levar
a ponta."
faço uma nota para riscar aquele cachorro e dou uma olhada e
me parece que essa observação me foi dirigida; não há
mais ninguém em 15 jardas ao redor.
vejo a cara dele.
ele tem uma cara que a maioria das mulheres adoraria: extremamente
macia e
branca.
ele permaneceu quase intocado pelas circunstâncias, é um
milagre do zero.
eu o encaro encantado.
é como olhar um lago de leite
nunca perturbado nem por uma pedrinha.
volto a olhar para meu boletim.
"qual você prefere?", ele pergunta.
"senhor", eu lhe digo, "prefiro não falar."
ele me olha por trás de seu bigode negro perfeitamente
aparado, não há nenhum pelo fora do lugar;
eu tentei bigodes; nunca liguei o bastante para espelhos
para deixar um bigode parecer tão antinatural.
ele diz, "ouvi falar de você. você não gosta de falar
com ninguém".
levanto, pego meus papéis, caminho por três fileiras para baixo e 16
assentos adiante. chego a meu último refúgio, pego meus
protetores de ouvido vermelhos, enfio-me neles.
ser o guardião de meu irmão só iria fazer com que eu me recolhesse
entre muros em um lugar
onde tudo é a mesma coisa.
sinto pelos solitários, sinto por suas necessidades, mas também sinto
que os solitários são feitos uns para os outros e que eles deveriam se
encontrar
uns aos outros e me deixar em paz.
assim, de protetores de ouvido, perco a cerimônia de hasteamento da
bandeira, mergulhado no boletim.
eu teria gostado de ser humano
se eles deixassem que eu fosse.
ir às pistas de corrida é como ir a qualquer outro lugar exceto,
falando genericamente,
que há mais pessoas solitárias por lá, o que não adianta muito.
elas têm o direito de estar lá e eu tenho o direito de estar lá.
isto é uma democracia e todos nós fazemos parte de uma
família infeliz.
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2 Vistas

meu amigo diz, como é que você pode escrever tantos poemas
daí desta janela? eu escrevo, do útero,
ele me diz. a coisa escura da dor,
a ponta da pena da dor.
bom, isso impressiona muito
mas acontece que eu sei que nós dois recebemos uma boa quantidade de
cartas de recusa, fumamos uma boa quantidade de cigarros,
bebemos demais e tentamos roubar as mulheres
um do outro, o que não é poesia de jeito nenhum.
e ele me lê seus poemas
ele sempre me lê seus poemas
e eu ouço e não digo muita coisa,
olho pela janela,
e lá está a mesma rua
minha rua,
minha rua bêbada, ensolarada, enchuvarada, da
criançada,
e à noite olho para esta rua
às vezes
quando ela pensa que não a estou olhando,
os 1 ou 2 carros movendo-se silenciosamente,
o mesmo velho, ainda vivo, em sua
caminhada noturna,
as cortinas das casas cerradas,
o amor falhou mas
se aguenta
então vamos em frente.
mas agora é dia claro e as crianças
que algum dia serão homens velhos e mulheres velhas
caminhando através de seus últimos momentos,
essas crianças correm ao redor de um carro vermelho
gritando qualquer bobagem,
então meu amigo pousa seu poema.
bem, o que você acha?, ele pergunta.
tente assim e assim, eu cito uma revista
e então estranhamente
penso em guitarras sob o mar
tentando tocar música;
isso é triste e bom e quieto.
ele me vê parado à janela.
o que há lá fora?
olhe, eu digo,
e veja...
ele é 11 anos mais novo que eu.
ele se afasta da janela. eu preciso de uma cerveja,
não tenho mais cerveja.
caminho até a geladeira
e o assunto está encerrado.
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Tristeza no Ar

aqui estou eu sentado sozinho
feito um frouxo
ouvindo Chopin
o vento notumo soprando
através das
cortinas rasgadas.
hoje ganhei 546 dólares nas corridas mas
agora estou pensando que
morrer é uma coisa tão
estranha e ordinária.
só espero nunca precisar
de uma dentadura postiça antes de
ir embora.
Wm. Holden arrebentou sua cabeça
em uma mesa de café
quando bêbado e
sangrou até morrer;
duro e teso por 4 dias
antes de ser encontrado.
pergunto-me: como Chopin se foi?
as coisas passam, isso não é
novidade.
aqui em L.A.
vi tantos bons
lutadores mexicanos
chegarem e irem
subindo pelas
cordas
jovens e cintilantes de
ambição
e depois
se desvanecerem.
para onde eles vão?
onde estão esta noite
enquanto ouço Chopin?
quem sabe se eu não estou em um negócio
melhor?
eu não acho.
escritores também vão embora
depressa
esquecem como criar
uma
frase reta e firme.
então dão aulas
escrevem artigos de crítica
lamentam-se
ficam estragados
somem.
Holden escorregou em
uma passadeira
sua cabeça batendo no criado-mudo
ele tinha um nível de álcool
de .22 no sangue.
quanto a mim
já desabei
muitas vezes usualmente
sobre um fio de telefone.
odeio telefones
de todo modo
sempre que algum toca
eu dou um pulo.
pessoas me perguntam: "por que você
dá um pulo quando o telefone
toca?"
se elas não sabem
você não pode responder
está esfriando.
eu vou fechar a janela.
eu fecho a janela.
Chopin continua.
quando você bebe sozinho
como Wm. Holden
às vezes você tem
alguma coisa em mente
que não se pode contar
a ninguém.
em muitos casos é
melhor ficar
quieto.
não fomos colocados aqui para
gozar dias e noites
tranquilas.
e quando o telefone
toca
você também saberá que
todos nós
estamos no negócio errado.
e se você não souber
o que isso significa
você não sentirá a
tristeza no ar.
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Lei

veja, ele me disse,
todas essas criancinhas morrendo nas árvores,
e eu disse, o quê?
e ele disse, veja,
e eu fui até a janela
e, com certeza, lá estavam elas dependuradas nas árvores,
mortas e moribundas.
e eu disse, o que isso significa?
e ele disse, eu não sei mas foi autorizado.
no dia seguinte quando despertei
eles haviam colocado cães nas árvores
mortos e dependurados e moribundos,
e eu me voltei para meu amigo e disse,
o que isso significa?
e ele disse, não se preocupe,
as coisas são assim, houve uma votação,
foi resolvido,
e no dia seguinte foram gatos,
não entendo como eles pegaram todos aqueles gatos com tamanha
rapidez
e os dependuraram nas árvores
mas eles fizeram isso,
e no dia seguinte foram cavalos e não foi nada bom
pois muitos galhos quebraram,
e depois do bacon com ovos no dia seguinte,
meu amigo me apontou uma pistola
por cima do café e disse,
vamos,
e saímos
e lá estavam todos esses homens e mulheres nas
árvores, a maioria deles mortos ou
moribundos, e ele pegou a corda, e eu disse,
o que significa isso? e ele disse, não se preocupe,
foi autorizado, é constitucional, foi aprovado pelo
voto majoritário, e ele amarrou minhas mãos às minhas costas,
depois abriu o laço.
não sei quem vai me enforcar, ele disse,
quando eu terminar com você. suponho, no fim das contas,
que só vai sobrar um de nós
e ele terá que se enforcar
a Si mesmo.
supondo que ele não faça isso?, eu perguntei.
ele terá que fazer isso, ele disse, foi autorizado.
ó, eu disse, bem, vamos em frente
com isso
então.
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Uma Sede Imensa

tenho me tratado com anticorpos por quase 6 meses, baby, para curar um
caso de tuberculose, cara, sobrou para um velho como eu pegar
uma doença tão
antiquada, pegar uma do tamanho de uma bola de basquete ou como uma
sucuri
engolindo um macaco gibão; então agora estou me tratando com
anticorpos e me disseram para não beber
ou fumar por 6 meses, e falam sobre morder ferro com seus
dentes, eu tenho bebido e fumado pesadamente e firmemente com os
melhores
e os piores deles por mais de 50 anos, é,
e a parte mais difícil, parceiro, é eu conhecer gente demais que
bebe e fuma e eles continuam a beber e fumar direto na minha frente
como se
eu não estivesse me segurando para não quebrar seus crânios e rolá-los
pelo assoalho
ou só afugentá-los para bem longe da minha vista - uma vista que
anseia muito por qualquer coisa mesmo microscopicamente viciante.
a parte difícil seguinte disso é ficar sentado à máquina de escrever sem
aquilo,
quero dizer, isso foi meu show, minha dança, minha distração, minha
raison dºêtre, é isso, misturando fumaça e bebida com bater à máquina e
você pode
apostar que é onde a sorte chove dia e noite e o restante do tempo, e
você ouve a frase "cortar é um bode" mas eu não acho que seja
forte o bastante, deveria ser "fazer picadinho é um bode" ou "enterrando
o bode
ainda quente", enfim não tem sido fácil, não não não não não não não
não não não,
e quando eu olho para uma garrafa de cerveja
parece sol engarrafado, uma tragada de cigarro é como o sopro da vida
e uma garrafa de vinho tinto parece o sangue da própria vida.
para mim, é difícil pensar no futuro ou preocupar-me com isso: o
presente
imediato parece tão esmagador e agora eu simpatizo com todos aqueles
que fracassam
em dominar sua bebida e seu cigarro
pois estes últimos 6 meses têm sido os 6 meses mais longos da minha
vida!
desculpe aborrecê-lo com tudo isso, mas não é por isso que você está
aqui?
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Maldito Rimbaud

foi em Santa Fé.
estávamos sentados esperando-a.
ela havia ido a alguma exposição de arte ou qualquer outra
maldita coisa inútil.
era uma boa artista
melhor que muitos homens
e esse era O
problema.
"que diabo aconteceu com Helen?"
"onde está Helen?"
o marido de Helen, ex-marido, agora estava sentado no topo de uma
colina em algum lugar com uma nova puta de olhos azuis.
uma puta
muito puta: ela até escrevia
poesia. Vicki era o nome dela. Vicki agora era "Sra."
ela havia trocado um marido rico por outro mais
rico ainda.
"Helen me pediu para não odiar Vicki!", disse minha anfitriã,
"mas que diabo, não consigo gostar de Vicki."
"que diabo", disse meu anfitrião, "você não pode nem
tentar?"
"você gosta de Vicki?", perguntou minha anfitriã.
Vicki me parecia legal. eu não conseguia achar nada de errado
nela.
"onde está Helen?", perguntei de novo. "oh onde oh onde diabos está
Helen?"
"ela vai chegar, ela vai chegar, ela disse que estava
chegando."
Helen apareceu 3 horas mais tarde.
ela parecia uma serpente em um vestido verde, todo fluido,
louco louco, lustroso,
seu colar prateado pulsando
em sua garganta
bem debaixo do meu nariz.
ela era consumida por 3 simples coisas:
bebida, desespero, solidão; e mais 2:
juventude e beleza.
era demais:
eu não podia resistir à força
dela. eu a beijei. eu a beijei
de novo. eu era como um garoto na escola,
toda a minha dureza
tinha desaparecido.
"vamos cair fora daqui!"
eu lhe disse, ignorando nosso anfitrião e nossa anfitriã.
fomos para sua casa logo ao lado
e eu fiquei na cozinha bebendo e
observando-a.
"seu corpo, seu corpo, Jesus!", eu lhe
disse. ela era realmente bela e dava risadas,
como quando você lê a respeito em um romance
só que isso nunca acontece com
ninguém.
ela contorceu seu corpo e enquanto cantarolava
fez uma adorável dança repleta de
insinuações.
"baby, eu te amo", eu disse, "baby, eu te
amo!"
nós descemos para um salão escuro com um crucifixo
na parede e alguns de seus quadros. entramos em
outro quarto grande. continuei no meu
drinque.
"fique aqui", ela disse.
sentei-me em um sofá e bebi. parecia
frio e vazio de repente e eu
me perguntava aonde ela havia ido.
então olhei em volta e ela estava deitada em outro sofá
nua e sorridente
o que foi inesperado
pois estou acostumado a despir minhas
mulheres.
e a visão dela ali nua em pelo me fazia lembrar mais
dos meus dias no matadouro do
que de Mozart,
mas, é claro, quem quer foder
com Mozart?
terminei meu drinque e tirei a roupa e tentei
mas acho que não estava lá essas coisas
foi minha culpa
minha culpa
e ela me empurrou
pra longe.
eu fiz mais algumas tentativas
desanimadas e então ela se levantou e saiu.
também me vesti e depois
não me lembro de muita coisa exceto
de estar um bocado bêbado.
mas quando ela me pôs para fora na chuva
eu ressuscitei.
a chuva estava molhada a chuva estava fria a chuva estava
gelada.
"merda!", eu disse, "merda!" corri de volta para
a porta dela ou a porta que achei que fosse dela
mas parecia haver dúzias de portas,
uma série de apartamentos todos
engatados.
bati na porta que esperava ser a dela:
"baby, baby, eu não quero foder com você! sei que sou
um amante horrível! tudo o que eu quero é sair
desta maldita chuva!"
ela não respondeu. eu desisti. voltei correndo para
o apartamento do meu primeiro anfitrião. bati na porta.
não adiantou. a chuva era como gelo.
olhei para uma garagem aberta mas estava cheia de lama e água;
nenhum lugar para me deitar.
"deixe-me entrar!", eu gritei. "Jesus! misericórdia! o que eu fiz?
em que eu falhei? VOCÊ É O GUARDIÃO DO SEU IRMÃO!"
meu anfitrião apareceu na porta:
"você é um cachorro sujo!"
"eu sei, mas deixe-me entrar,
por favor."
ele abriu a porta e eu o segui pela
sala.
"cara oh cara." ele disse, "você é um filho da puta, você é um
cachorro covarde, você não vale nada!"
"eu sei," eu disse.
"você contou para ela que eu era um ex-condenado?"
"diabos, não, nem estava pensando em
você."
"então que diabo você quer de
mim?"
"nada, você me pagou a passagem de
trem de volta."
"você insultou a nós dois. eu não me importo comigo mas você não pode
insultar minha mulher. você disse para Helen, "vamos eu e você cair
fora daqui, essas outras pessoas não são de nada!"
"foda-se. você ainda tem algum uísque
sobrando?"
"na geladeira."
"obrigado."
ele grunhiu e subiu para a cama ao lado de sua
mulher.
eu peguei a garrafa e a trouxe para minha cama
e beberiquei beberiquei beberiquei e escutei a
chuva. pensei que a noite tivesse
passado mas aí ele começou
outra vez:
"pensei que você fosse um grande escritor
pensei que você fosse um grande homem
foi por isso que paguei sua passagem até aqui
foi por isso que publiquei sua poesia
foi por isso que quis que toda essa gente o
conhecesse!"
"está certo", eu disse tomando goles do bom uísque.
"eu tenho que ir embora de manhã. por que não vamos todos
dormir?"
"você é realmente um filho da puta!
nunca pensei que você fosse um tamanho filho da puta!
por que você fica sempre com seus olhos semicerrados?
por que você não é capaz de encarar um homem?
por que você sempre desvia o olhar?"
"não sei, não sei."
"você é covarde, é isso: COVARDE!"
eu sabia que era verdade
e tomei um gole grande de uísque e
disse:
"você quer ir lá fora para brigar?"
"diabo! você tem dez anos de vantagem sobre mim!"
"eu lhe dou o primeiro
soco!"
"você promete que vai embora de manhã?"
"com certeza."
Helen soube que eu iria embora
através deles eu acho
e ela chegou lá mais cedo na manhã seguinte para saber se
podia me levar até o hotelzinho para pegar o ônibus até
a estação de trem.
ela ainda estava linda
até mais do que antes
vestindo calças justas e mocassins indígenas e
enquanto ninguém estava olhando
eu me estiquei e peguei seu
pé. ela ignorou mas não me mandou
para o inferno
então me senti todo aquecido
por dentro.
"está bem, eu o levo até lá", ela disse a meus
anfitriões.
"obrigado", eles disseram.
entrei para dar uma
cagada.
"detestamos vê-lo ir embora", eu ouvi
meus anfitriões dizerem.
"eu também", ela
disse.
um cagalhão
saiu.
"voltarei às 2h. para apanhá-lo",
ela disse.
"até logo."
"até logo."
quando eu saí havia 2 índios sentados lá
com meus anfitriões.
o Chefe disse: "eu adiantei aquele negro 8 mangos
por 2 sacos de quatro libras de feijão. passaram 2
semanas e ele ainda não voltou. ele trabalhou para alguma companhia de
cimento.
dê-me sua caderneta de telefones, eu vou encontrar aquele
desgraçado!"
apresentaram-me à sua "squaw". eu a beijei no
rosto. ela deu uma risadinha. tinha uns 60 anos e
um defeito nas pernas.
"estou com problemas," disse o Chefe, e
então arrancou o cobertor do meu catre
e o enrolou em volta de si.
"sou grande Chefe", ele disse, "e tudo que preciso é um
bom pedaço de rabo e depois ir pegar aquele negro."
"não olhe para mim", eu lhe disse, "não sou
nem um nem outro."
o Chefe me olhou:
"acho que preciso de um banho",
ele disse.
ele foi lá e entrou em uma das 3 banheiras em um dos
3 banheiros. então a "squaw" resolveu que ela também precisava tomar
um banho. e depois mais alguém resolveu que precisava dar uma
cagada. todos desapareceram. eu tomei meu drinque e voltei a
dormir.
"sentimos muito por vê-lo ir embora", uma
voz disse, me despertando.
os índios haviam ido embora.
"tudo bem", eu
disse.
ninguém discutiu
comigo.
entrei no carro com Helen e a vista de
seus joelhos de nylon fez martelos baterem em meus miolos.
eu estava tão triste por nunca vir a possuir algo de bom,
algo como ela,
que nada de bom nunca viesse a me pertencer
não porque eu estivesse sempre pobre de dólares
mas porque eu era pobre em expressar-me a dois.
eu era tão amarelo de covardia quanto o sol talvez
mas também tão quente e tão verdadeiro quanto o sol
em algum lugar lá dentro de mim
mas nunca ninguém acharia esse lugar.
eu certamente acabaria para sempre chorando os blues em uma
xícara de café em um parque para velhos jogarem
xadrez ou algum outro jogo bobo.
merda! merda!
e então Helen engatou a marcha e rodamos através das
ricas colinas e não havia nada que eu pudesse lhe dizer
sobre sua beleza ou o quanto eu era durão
ou que só ficar sentado e olhá-la por um mês
sem nunca tocá-la de novo
seria meu único desejo
mas como um desgraçado eu provavelmente estava mentindo para mim
mesmo
eu provavelmente queria tudo tudo
mas agora aos 45
tendo vivido com uma dúzia de mulheres e sem amar nenhuma delas
eu agora estava louco, acabado, enquanto ela
me levava através das colinas tudo gritava dentro de
mim, e eu continuava a dizer enquanto seguíamos
(para mim mesmo, é claro)
fodão, vai passar,
tudo passa,
tudo é uma piada
uma piada sobre você,
esqueça, pense em cachorros mortos coisas mortas pense em
você: indesejado, quebrado, simples, um suposto poeta que escreve
coisas profundas, mas você não é capaz de escrever sobre nada exceto
VOCÊ MESMO. não é verdade? não é verdade? você é uma porra,
um trouxa centrado em si mesmo só esperando por alguma saída fácil?
você anseia
por dinheiro, palanques cheios de aplauso, reconhecimento e um livro
de poemas que ainda será admirado no ano de 2179.
você é um impostor de merda covarde que grita: você não vai conseguir
e
é bom você acostumar-se a isso
agora.
nós rodamos até o hotelzinho
e o pobre poeta impostor disse,
"eu posso lhe dizer adeus?" era
como um filme ruim, só que não era um filme:
eu podia entender Crime e Castigo de Dos
eu podia entender a lua inclinando-se sobre um bar no beco
ao pedir um drinque, mas eu não podia entender nada sobre mim mesmo
eu estava assassinado, eu era um merda, eu era uma matilha de cães,
eu era papoulas ceifadas por rajadas de metralhadora
eu era uma vespa presa em uma teia de aranha
eu era cada vez menos e menos e ainda assim tentando alcançar
algo, e eu pensei em seu comentário banal
a noite passada ou algo assim:
"você tem olhos feridos."
piegas, é claro, mas tudo o que vem de uma mulher
de verdade não é piegas
e eu pensei em suas pinturas decentes de pessoas e coisas
chegando lá querendo querendo
e como um japa na trincheira cercado por heroicas
tropas americanas
eu a beijei
em despedida.
"sinto muito por não ter conseguido ser legal com você",
ela disse. "eu não estava pronta, acho."
"não, foi minha culpa",
eu lhe disse.
entrei no hotelzinho daquela
cidadezinha (de onde levavam de ônibus
até o trem) e me perdi, merda, me perdi,
não conseguia achar a bilheteria, degraus para
cima e para baixo
entrar e sair pelas portas
lágrimas de novo finalmente
como um filme ruim de novo, e
finalmente eu achei o vendedor de bilhetes
e consegui fazer o negócio
de comprar um bilhete.
saí e me sentei no saguão e
olhei por cima do meu bilhete
e lá estava ela.
"o que você está fazendo aqui?", eu perguntei.
"vi você todo encurvado e triste e friorento.
não parei de pensar em você."
o ônibus para o trem estava atrasado, tudo estava
atrasado, assim ela me levou de carro até a cidade nesse meio-tempo e
tive que repassar
a coisa toda com ela.
e eu sabia que mesmo as palavras mais apropriadas nunca resolveriam.
eu estava sujo, sujeira, eu parecia sujeira,
eu estava sujo de sujeira suja,
eu só queria entrar nela,
ficar lá, eu não era nada a não ser um comedor de buceta e
eu estava quebrado. eu não sabia soletrar, eu nem sabia como usar
2 ou 3 garfos para jantar, eu não sabia nada sobre Harvard ou
diplomas ou 50 mil por ano, e ela sabia que tudo isso
era verdade: eu havia sido chutado por aí por muito tempo, eu não sabia
mais
o caminho para cima ou para fora ou nem queria saber: eu estava
destinado ao
fracasso.
eu disse adeus de novo
sugando tudo o que havia sido deixado dela dentro do
pouco que foi deixado de
mim. eu disse: "não me procure de novo. foda-se.
nós estamos todos perdidos. adeus, adeus".
ela era grande. ela foi embora. observei o último clarão
dela dobrar a esquina e desaparecer e
então caminhei de volta até o saguão do hotel.
eles eram boa gente, 5 ou 6 bundões sentados quietos
à espera ali.
2 eram médicos. um outro era dono de qualquer coisa grande
e importante. todos tinham esposas. começava a
nevar.
todos subimos no ônibus para seguir até
o trem. eu já estava dormente,
dormente de novo,
dormente
de novo
e mais uma vez e mais uma vez,
torpor e dor crescendo em
mim - assim como nos bons
velhos tempos.
o mexicano dirigiu rodovia abaixo e quase arrebentou a
embreagem.
pessoas confortáveis faziam piadas confortáveis
sobre o tempo e coisas
mas eu fiquei mais em silêncio
dizendo uma palavra ou outra quando necessário
uma palavra ou outra
tentando esconder-me do fato de eu ser um idiota
e sentido-me horrível
e as pequenas colinas começaram a cobrir-se de neve
vagarosamente as coisas tornaram-se brancas
vagarosamente as coisas tornaram-se mais brancas
e eu sabia que tudo finalmente passaria
e graças à boa graça do bom Deus
meus anos e meu tempo estavam acabando;
seguimos em frente e cada vez mais em frente,
por vilarejos e tanto as coisas boas quanto
as coisas más estavam acontecendo às
pessoas naqueles vilarejos também,
mas eu continuava a não ser nada
a não ser braços e orelhas e olhos e talvez ainda houvesse
alguma sorte para mim ou
mais morte amanhã.
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Enfeitiçado em Nova York

a senhora foi a mais infiel e terrível que eu jamais havia
encontrado e eu sabia disso e ela sabia disso e ela era
as duas coisas, feia e linda ao mesmo tempo e as
duas dela estavam sentadas ali no peitoril
daquela janela aberta no hotel
em Nova York em
um dos dias mais quentes de todos os tempos, sem
ar-condicionado, sem ventilador, suávamos e sofríamos e esperávamos
algo
acontecer.
eu estava bêbado, ela estava nas drogas, havíamos acabado
de concluir uma copulação
rapidinha e logo depois ela disse, "seu filho da
puta, nós estamos encalhados aqui no inferno!"
"bom", eu disse.
então eu a vi cair da janela, estávamos
no quarto andar, eu escutei o grito,
seu corpo se havia ido.
então estava de volta, ela sentada no
peitoril da janela outra vez. "você viu isso?", ela
perguntou. "eu caí da janela!"
"bom", eu disse.
"mas de algum modo eu me empurrei de volta para dentro!", ela
disse.
"bom", eu disse.
"isso é tudo o que você sabe dizer?", ela perguntou.
"bom???"
"eu consigo dizer que acho você uma bruxa ou um demônio
e que seu ato na janela agora só prova
isso."
eu senti que por cair para fora ela havia melhorado meu
humor e que ela o havia estragado de propósito
ao subir de volta
para dentro.
"então eu sou uma bruxa ou um demônio, é? bem, então chega de
bunda para você!"
"bom", eu disse.
às vezes você vive e fica com uma mulher e não tem ideia
real do porquê.
com ela eu sabia: era o simples, fascinante,
inexorável mistério e terror
de ela ser assim.
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Não Se Preocupe, Querida, Vou Dar Um Jeito

ele a viu em uma loja de bebidas
e isso mexeu com ele
mexeu mexeu mexeu
igual a came de tubarão ainda viva à luz do sol remexendo-se.
ele lançou seus olhos sobre ela,
um milagre, a ouviu falar com ele,
ela era divertida, ela o fazia dar risadas, ela o fazia sentir como se
todas as portas estivessem abertas para ele.
foi fácil. ela voltou com ele para sua casa.
eles conversaram. foi fácil. ela era uma foda gloriosa. eles
foderam 3 vezes. ela
ficou.
"Smaltz", telefonaram-lhe do serviço no dia seguinte,
"o que você está fazendo, por que você não veio?!
nós temos a encomenda da Granger-Wently para despachar:
45 rodos de seis pés e 90 galões de
tinta Day-Glo ultramarina! Db
"estou ocupado," ele disse, e eles responderam,
"podemos conseguir um despachante de cargas
em qualquer lugar!" ele desligou, a virou e
a fodeu
de novo.
não foi a mesma coisa que com as outras:
toda vez que acabava ele sentia que ainda queria mais.
quando ela se dirigia ao banheiro era como se ele
não a tivesse tido realmente, e qualquer coisa que ela vestisse,
um chapéu feito de jornais, um par das suas meias, ela parecia
gloriosa, divertida divertida, diabos, ela o fazia sentir-se bem,
tudo o que ela dizia, porra, era uma
piada, ela encostaria aquele seu corpo contra o seu toda manhã e
diria, "ah, não vá pro trabalho, Eddie querido, fique comigo!"
"Eu não posso ir trabalhar, meu bem, eu não tenho mais emprego", ele
diria,
e eles começariam tudo
de novo.
e assim chegou o dia: sem aluguel, sem café, sem vinho, sem
cigarros. o senhorio declarou: mais um dia;
resolva ou caia fora -!
"merda, eu achei que você sabia o que estava fazendo",
ela disse a Smaltz, pela primeira vez ela não estava
divertida.
"não se preocupe, querida, vou dar um jeito", ele lhe disse,
e partiram para uma última das boas.
sorte, ele tinha a .32. pensou, loja de bebidas, não, eu vou
meter a mão na massa, ela vai ter de
tudo, ela é minha, para mim, chapéu de papel, todo esse
rebolado, deus, não há nada
igual.
ele tentou o banco. aquele grande e cinzento lá perto.
ele entrou. estava pronto: a .32, o saco de papel, o bilhete:
"um assalto. quieto e você não morre. nada de apertar o botão, ponha
dinheiro no
saco. eu estou desesperado e vou matar. por favor, deixe nós dois
vivermos".
ela esvaziou a gaveta no saco. ele viu:
monte de notas de cem, de cinquenta, minha nossa. uma viagem a Paris.
a caixa do banco também parecia boa. ele gostaria de fodê-la,
quem não gostaria.
ele estava quase na porta
quando sentiu que ela havia disparado o botão
de alarme. eles até haviam afastado a
multidão. o guarda na porta foi fácil -
era tão gordo que Smaltz não teve como errar:
ele caiu como um boneco.
lá fora ele viu o carro da polícia:
a coisa estava indo na contramão da
rua - como podiam fazer aquilo? -
acompanhando-o enquanto ele corria
e disparando tiros em seu rabo,
chegando perto; ele subiu correndo por um beco sem saída,
mas alcançou um elevador de carga
parado. "sobe! SOBE!"
ele berrou para outro esquisitão
mas o esquisitão ficou parado
olhando para a sua .32, e ele atirou no esquisitão,
não havia mais nada a ser feito,
e ele estava mexendo nos controles, tentando
fechar as portas
quando eles o alcançaram ali, atiraram nele,
atiraram dentro daquele elevador vagabundo; ele não conseguia dar
um tiro de volta. eles o pegaram, pegaram o saco de papel da sua
mão.
na noite seguinte ela estava dormindo com o dono de uma
loja de ferragens, Harry, uma renda boa e sólida, 2 dedos
faltando em sua mão direita - acidente de caça em Indiana,
1938.
você consegue outro despachante de carga
em qualquer lugar.
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Aquela Garota Linda Que Entrou Para Trocar A Roupa De Cama

eu a conheci quando ela entrou para
trocar a roupa de cama.
St. Louis.
ela me disse: você está doente.
e eu disse:
sim, estou doente.
e ela disse:
você precisar beber algo.
eu vim para trocar a roupa de cama
mas você precisa beber alguma coisa
dê-me algum dinheiro e
eu volto com alguma coisa para
beber.
então
eu dei a ela o dinheiro
sem conhecê-la
mas ela voltou com algo para
beber.
ela sentou em uma cadeira e eu
fiquei na cama e nós bebemos
silenciosamente.
e então começamos a conversar
e então rimos um pouco
e eu comecei a me sentir melhor e ela
a parecer mais bonita
e eu disse:
eu não achei que você fosse voltar
e ela disse:
diabo, eu trabalho aqui.
e eu disse:
ah, por isso você
voltou.
e ela disse:
não, não foi por isso que voltei.
e eu
gostei disso.
mal consigo me lembrar de como aconteceu
mas logo estávamos os dois na cama
fumando cigarros e tomando
cerveja
naqueles canecões pesados
de meio litro.
ninguém parecia estar com pressa.
e aí começou
a funcionar. não sei como funcionou
mas foi legal. nós
trepamos.
e ela se levantou e fechou as janelas para o sul
e disse:
é isso que o está matando
essa fumaceira subindo da avenida
isso
e a bebida. pelo menos dá para afastá-lo
da fumaceira.
nós rimos e então ela voltou para a cama e nós
conversamos mais um pouco e fumamos e ela
saiu da cama e disse
que precisava ir embora -
o namorado dela vivia no andar de baixo com ela,
e eu disse adeus
e ela foi embora e
então eu olhei para a cadeira
e vi os lençóis limpos e brancos.
ela havia esquecido de trocar a roupa de cama
então eu me levantei e
troquei a roupa de cama por ela.
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Um Acordo Sobre Tchaikovsky

minhas duas pernas estão quebradas nos joelhos
e eu não posso mexer meu braço direito:
é primavera e os pássaros estão saltitando
para dentro e para fora dos arbustos
enlouquecendo os gatos.
meu bom amigo, Randy, frequenta os
sanitários para homens na pista de corridas
em busca de carteiras: garoto esperto:
se os pais dele fossem ricos
ele me diz que teria seguido
para Harvard.
ela fica tocando a 4a de Tchaikovsky,
aquela assim:
ka plunk plunk plunk plunk plunk;
não gosto
mas a velha senhora Rose
minha vizinha
na Casa de Repouso Sunset Park
acha que é
lindo.
todo mundo aqui é velho demais para usar
a quadra de tênis
há uma camada de pó em cima da coisa toda
e a rede é um emaranhado de fios rasgados.
a velha senhora Rose foi visitar seus filhos hoje -
isto é, eles vieram e a apanharam, o traste;
ela nem consegue andar
e suas pernas sequer estão quebradas -
ela não passa de um enfadonho
peido velho!
eu fui de cadeira de rodas há pouco até o quarto dela
e achei uma nota de 10 dólares dobrada bem
limpinha
e arrumadinha:
ela achava que ninguém a encontraria
dentro de um de seus velhos chinelos
mas eu estive rondando
e ela virá bater à minha porta esta noite
pedindo uma "pequena dose de scotch";
cara, toda essa besteira sobre as terras que ela COSTUMAVA
ter no Arizona e como seu marido COSTUMAVA
usar polainas e sair de bengala!
ele não precisa usar mais nada no lugar onde está agora;
e enquanto estive lá dentro
eu arrebentei a velha 4a de Tchaikovsky no braço de uma cadeira
quebrei-a para valer.
e a velha senhora Rose tinha razão:
soava maravilhosamente para mim:
qualquer coisa como
nozes quebrando.
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Homem Cortando A Grama do Outro Lado Da Rua

eu o vejo seguindo em frente com sua máquina.
ah, você é estúpido demais para ser cortado como grama,
você é estúpido demais para qualquer coisa o violar -
as garotas não usarão suas lâminas em você
elas não querem
que suas lâminas afiadas sejam desperdiçadas em você,
você está interessado apenas em partidas de beisebol e
filmes de faroeste e lâminas cortadoras de grama.
você não pode ficar com uma só das minhas lâminas?
aqui está uma bem velha - enfiada em mim em 1955,
agora está morta, não o machucará muito.
não posso lhe dar esta última -
eu ainda não posso arrancá-la,
mas aqui está esta outra de 1964, que tal arrancar
esta de 1964 de mim?
homem cortando a grama do outro lado da rua
você não tem uma lâmina enfiada em suas entranhas
onde o amor o largou?
homem cortando a grama do outro lado da rua
você não tem uma lâmina enfiada bem fundo em seu coração
onde o amor o largou?
homem cortando a grama do outro lado da rua
você não vê as garotas passeando pelas calçadas agora
com lâminas em suas bolsas?
você não vê seus lindos olhos e vestidos e
cabelos?
você não vê suas lindas bundas e joelhos e
tornozelos?
homem cortando a grama do outro lado da rua
isso é tudo o que você consegue enxergar - essas lâminas de cortar
grama?
isso é tudo o que você consegue ouvir - o ronco do cortador de grama?
eu posso enxergar o caminho todo até a Itália
o Japão
as Honduras
eu posso ver as garotinhas afiando suas lâminas
pela manhã e ao meio-dia e à noite, e
especialmente à noite, ah,
especialmente à noite.
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Sopa, Cosmos e Lágrimas

conheci muitas mulheres loucas
porém a mais louca foi
Annette
e parece que quanto mais loucas são
tanto melhor trepam,
e que corpo elas
têm. Annette sempre viveu com
chineses
mas você nunca os via
e era isso o que metia medo.
até a Máfia tem medo dos chineses -
"cadê o dragão, garota?"
"está tudo bem. ele sabe que está tudo bem com você."
"tem certeza? quando põem o X em você,
então você pode muito bem
esquecer."
"eu disse a eles que está tudo bem com você. isso é tudo que
eles precisam."
Annette tinha incenso queimando,
toda espécie de mapas e livros malucos,
ela sempre falava sobre os deuses
ela tinha uma linha direta com os deuses.
"você foi selecionado pelos deuses", ela me
disse.
"está bem, garota, vamos transar
então."
"agora não. quero que você experimente esta sopa especial
que eu fiz."
"sopa especial?"
"sim, tome-a e você herdará as forças da
terra e do sol, o cosmos
inteiro."
lá fui eu e tomei a sopa. francamente, o gosto era bom,
embora meio enferrujado. nem queira saber que diabos ela
pôs lá dentro. eu a tomei
toda.
"eu me sinto como um homem de aço
agora."
"você herdou a força", ela disse, "os deuses estão
orgulhosos de você."
no sofá eu finalmente a
agarrei. debaixo daquele leve vestido cor de laranja
havia bastante mulher para matar um
boi.
"morei naquele hotel em Paris", ela disse. "dormi com todos
eles. Burroughs, a turma
toda. conheci Pound em St. Liz."
"você dormiu com Ezra?"
"mais do que com qualquer outro!"
"ora, vá se foder!"
"vá", ela riu, "em frente."
foi uma boa
sopa. aqueles rapazes de Paris e
Ezra haviam conhecido uma boa
égua.
eu saí
dela.
quando ela voltou do banheiro estava
com uma garrafa na mão e começou a me salpicar
com o
conteúdo.
"ei, que porra é essa?"
"as lágrimas dos
deuses."
"as lágrimas dos deuses?"
"sim, as lágrimas dos
deuses."
eu fiquei lá deitado até que ela
terminasse.
então eu me levantei e me
vesti.
"quando posso ver você
de novo?"
"em 2 horas ou
amanhã"
eu saí em direção à porta.
"você caminha como um
poema", ela disse.
"vejo você em 2
horas", eu lhe
disse.
a porta se fechou. o que um homem tem que aguentar por
um rabo
nestes tempos modernos é
altamente
suspeito.
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Licença Médica

aqui estou deitado de barriga para baixo, Hem está morto, Shake está
morto,
os peixes que pesquei e comi e caguei estão mortos
e o médico está martelando um tubo de vidro em meu rabo,
um tubo de vidro com uma luzinha no final,
e estou torcendo por um atestado médico
para mais 2 dias de licença
e o doutor faz o jogo direitinho: "você tem umas belezas aí,
você deveria ser cortado..." bem, os russos brancos costumavam
cavar um buraco em um homem e agarrar a ponta do seu intestino
e pregá-lo a uma árvore e em seguida obrigavam o homem a
correr dando voltas e voltas na árvore.
ele puxa o tubo de vidro para fora do meu rabo
e uma parte de mim vem junto
ele tem uma cara de castanha e quando sua enfermeira
se debruça (o que é frequente)
a bunda dela é como um travesseiro macio ou
uma rosquinha açucarada, nada de sangue, só nuvens,
e digo, "Doutor, acrescente um dia à licença médica,
posso sentir a dor até lá embaixo nos meus bagos..."
"com certeza," ele diz, "com certeza, eu conheço um monte de rapazes
da agência dos correios, todos bons rapazes."
em casa saco a tampa da garrafa
e tomo o primeiro gole da boa: chovia enquanto ele remexia em mim:
a chuva continua a luzir na janela
como moscas comendo sonhos,
e abro o boletim de apostas com meu polegar,
em seguida telefono para meu agente
"...dê-me 2 para Indian Blood,
5 na ponta para Lady Fanfare, 5 de placê em The Rage."
desligo e penso suavemente em Kafka
dormindo sob patas de esquilos
enquanto a senhora do outro lado do corredor canta para seu canário.
o amor se acendeu e se apagou
como um isqueiro
e agora o amor dela é um
pássaro.
é assim quando não acontece muita coisa
e você atua em um palco pequeno,
e eu espeto minha licença médica
sobre um dos meus velhos quadros
esfrego um pouco de unguento em meu rabo
e me sirvo de mais um drinque.
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O Que Fez Você Perder Sua Inspiração?

Norman goteja uma imbecilidade
autocomplacente enquanto fica sentado em meu sofá e
dá risadinhas, puxa
sua barba doentia
e fala de sua namorada Katrinka,
Eugene Debs, F. Scott Fitzgerald e
LSD.
um mau escritor, quase inédito, isso lhe
dá forças enquanto
ele fica ali e me conta
que minha própria escrita desceu ladeira abaixo de
uma erupção vulcânica para uma faísca
de isqueiro.
eu lhe dou algo para beber e
ele desce para o assoalho e
começa a falar para dentro do meu gravador.
acendo um charuto e
Ouço.
"quero ser o escritor Número Um do Nosso
Tempo. quero andar pelas ruas e ouvir as pessoas
dizerem, "ei, veja, lá vai Norman! quero que as pessoas
gostem de meus poemas, quero que as pessoas enlouqueçam com meus
poemas..."
resolvo que essa provavelmente é uma gravação honesta
mas de má qualidade
e não ouço
mais.
uns 30 minutos e 3 latas de cerveja mais tarde
a fita termina de
rodar. Norman ajusta sua gravata,
ergue-se da posição de joelhos e fica
sentado.
"Jack M. diz que tem que faturar 8 mil este ano ou ele estará
acabado."
eu começo outro
charuto.
"vou almoçar com Ray
Bradbury, na terça."
eu não respondo.
"Jesus!"
ele de repente dá um pulo, corre para o meu banheiro e
começa a vomitar. isso prossegue por algum
tempo.
"eu me sinto melhor", ele diz
voltando
para a sala.
"tome mais um drinque", eu digo.
"eu o levarei de carro para a sua aula
de manhã."
"ótimo", ele diz, tirando a espuma do topo de uma cerveja.
aí ele me olha e pergunta,
"onde você tem sido publicado
ultimamente?"
eu estendo a palma das mãos e
dou de ombros.
"Jesus, ora essa! o que fez você perder sua
inspiração?"
"bebida. gente. casamento. gente.
casamento outra vez. um filho. bebida.
gente. empregos. desempregos. bebida e
gente."
"meu professor gostaria que você conversasse com
seus alunos. ele ganhou o Prêmio Lamont de Poesia e
gosta de você."
"diga ao seu professor para ir para o inferno. diga-lhe que
eu estou acabado."
"você é sensível."
"não, sou apenas um lampejo na
frigideira."
nós bebemos e bebemos. logo ele está dormindo
no sofá, 120 quilos dele sacudindo o telhado
com sua poesia.
eu vou para o quarto e ligo o despertador para as
10 da manhã da aula de inglês dele. a bebida desce
melhor agora, mas ao subir na cama
eu penso, de onde vêm esses desgraçados e
o que aconteceu com todo mundo? verdade, eu
estou enlouquecendo.
a luz se apaga
e então um alarme contra ladrões
em algum lugar por perto
se intromete em seus
roncos. muito pertinente, eu penso,
pertinente demais
para uma noite muito desperdiçada
em dezembro de
1965 ou
qualquer outro tempo
que for.
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Mais Um Poema Sobre Um Bêbado e Depois Eu Deixo Vocês Irem Embora

"cara", ele disse sentado nos degraus.
"seu carro precisa com certeza de uma limpeza e uma cera.
posso fazer por 5 pratas.
tenho a cera, tenho os panos, tenho tudo
que preciso."
eu lhe dei 5 e subi.
quando desci 4 horas mais tarde
ele estava sentado nos degraus, bêbado.
ele me ofereceu uma lata de cerveja.
disse que ia fazer o carro
no dia seguinte.
no dia seguinte ele estava bêbado de novo e
eu lhe emprestei um dólar para uma garrafa de
vinho. o nome dele era Mike.
um veterano da Segunda Guerra Mundial.
sua mulher trabalhava como enfermeira.
no outro dia quando desci ele estava sentado
nos degraus. ele disse,
"sabe, eu estava sentado aqui olhando seu carro
pensando como fazer melhor.
quero fazer bem feito mesmo".
no dia seguinte Mike disse que parecia que estava com jeito de chuva
e com certeza não faria qualquer sentido
lavar e polir um carro quando ia chover.
no dia seguinte estava outra vez com jeito de chuva.
e no outro dia.
depois nunca mais o vi.
vi sua mulher e ela disse,
"levaram Mike para o hospital,
ele está todo inchado, dizem que é de
beber".
"escute", eu lhe disse, "ele falou que ia polir meu
carro. eu lhe dei 5 dólares para polir meu
carro."
eu estava sentado na cozinha deles
bebendo com a mulher dele
quando o telefone tocou.
ela me passou o telefone.
era Mike. "ouça", ele disse, "venha para cá e
me busque. eu não aguento mais este
lugar."
quando cheguei lá
não quiseram me entregar as roupas dele
e assim Mike caminhou até o elevador em seu roupão de
hospital.
seguimos em frente e havia um garoto no
elevador comendo um picolé.
"ninguém tem permissão para sair daqui de roupão",
ele disse.
"você dirige esta coisa, garoto", eu disse,
"nós cuidamos do roupão."
parei na loja de bebidas para 2 engradados de meia dúzia
e então dirigi para casa. bebi com Mike e sua mulher até
as 11 da noite.
então subi.
"onde está Mike?", perguntei para a mulher dele 3 dias
depois.
"Mike morreu", ela disse, "ele se foi."
"sinto muito", eu disse, "sinto muito, mesmo."
choveu por uma semana depois disso e
imaginei que o único jeito de conseguir aqueles 5 de volta
seria ir para a cama com a mulher dele
mas você sabe
ela se mudou uns dois dias
depois
e um cara velho de cabelos brancos
se mudou para lá.
ele era cego de um olho e
tocava trompete.
de jeito nenhum eu faria aquilo
com ele.
assim, tive eu que lavar e polir meu próprio carro.
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Cachorro Morto

Bartkowski completou um arremesso a gol de 58 jardas
para derrotar o Packers no último minuto.
eu ouço pelo rádio
é domingo e estou a caminho das pistas de corrida
devo chegar para o terceiro páreo.
o Falcons segura a vitória e isso é bom.
desligo o rádio.
depois, quando a Harbor Freeway se ramifica
na Pasadena
vejo um cachorro na rampa
é dos grandes e é manco
mas ainda respira
sua cabeça está esmagada.
pessoas que levam cachorros em seus carros
e os deixam dependurados para fora da janela
quando esses cachorros caem na rodovia
muitas vezes elas apenas continuam a dirigir.
eu sei entrar no túnel.
você pega a pista mais à direita quando
as outras pistas desviam à esquerda.
eu sigo e cruzo.
quando saio do túnel
deslizo de volta para a via expressa.
esses filhos da puta e seus cachorros
mortos.
chego ao hipódromo à 1:20 da tarde.
vou ao estacionamento preferencial
acho uma vaga no F-5
tranco
e enquanto caminho entre os carros
vejo dois homens que
arrombaram um carro.
eles tiraram o rádio,
o estéreo e os alto-falantes.
eles me veem e eu os vejo.
"não diga nada, cara!
se você fizer isso, lembre-se de que nós o veremos
de novo algum outro dia!"
entro no hipódromo
são quatro minutos para apostar
no terceiro páreo que vem aí
a multidão apostou em Shameen
com Delahousseye montando
dando de 4 para 2 a 1.
Song for Two dá uma linha de 2
es.
avalio os cavalos
e aposto 10 em Song for Two na ponta.
Song for Two ganha no fotochart
o Shoe ainda sabe montar
e estou $31 à frente.
esses filhos da puta e seus cachorros
mortos.
perco o 4o, 50 e 60 páreos.
no 70 eles jogam Back"n Time para baixo
de 3 para 5 em uma tabela de 99
nos cinco quartos de milha em Del Mar
mas o potro tem 3 anos
competindo com cavalos mais velhos
e nunca correu a milha.
posso vê-lo entrando na reta
com uma liderança de 4 corpos e sendo batido
na chegada
por outro.
mas quem vai batê-lo?
ainda há 6 outros cavalos.
eu ponho $50 em Back"n Time na ponta
e assisto à corrida.
o potro tem quatro corpos de vantagem ao entrar
na reta
então Don F.
o menos provável no páreo
começa a chegar perto
e é cabeça a cabeça na chegada.
eles vão ver a foto
nós esperamos
então eles põem Don. F.
com 19 para 1.
eu pego $2.80 pelo placê
assim faço $20
perco o 80
aí fico apenas com $18.
no Jo
aposto 10 na ponta em Fleet Ruler
e 2 na ponta em Forecast
então deixo o hipódromo
fico no estacionamento
escutando o locutor
que está berrando
Forecast está na frente
e aí vem Fleet Ruler
é Fleet Ruler e Forecast
chegando juntos.
é evidentemente no fotochart.
vou até meu carro para sair
antes da multidão.
eu estou com o rádio
na estação dos resultados das corridas.
ainda estou na Pasadena Freeway
quando ouço o resultado:
é Forecast
e Forecast pagou $90.70
assim
o dia não foi de todo desperdiçado.
porém mais tarde
quando entro na via de acesso
lá está aquele gato de Manx
com sua cauda rudimentar e
com sua língua dependurada para fora.
ele se recusa a dar passagem para o carro.
eu desço.
pego-o e
o jogo no banco da frente.
entramos na garagem
juntos.
saímos do carro
e os outros dois gatos estão à espera
(amantes de cabeças de peixes, sonhadores com
pássaros)
abro a porta
e todos os gatos entram junto
comigo.
eles correm para a cozinha
eu noto que Dallas e San Diego estão jogando
agora. Danny White é zagueiro no
Dallas.
eu sempre gostei de Danny White,
esse é um jogador.
eu poderia assistir a algumas rodadas.
domingo é um dia de descanso.
todas as coisas importantes deveriam ser esquecidas.
decido que sequer vou alimentar os gatos
por algum tempo.
e na terça ou quarta-feira vou começar a trabalhar
em meu romance sobre a infância
outra vez.
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Tudo Certo, Camus

encontrei esse cara em algum lugar, inferno, seus olhos pareciam aqueles
de um louco
ou talvez fosse apenas meu reflexo neles.
bem, de qualquer modo, ele me disse, você leu Camus?
estamos ambos no bar sem mulheres procurando
um pedaço de rabo ou alguma saída através do teto do céu e
não estava funcionando - só havia o balconista do bar perguntando-se
por que
havia se metido nesse negócio
e eu, muito desanimado com o fato de até agora só ter sido traduzido
em 6 ou 7 línguas.
o cara continuava a falar -
O estrangeiro, você sabe, o livro que retrata nossa sociedade moderna -
sobre o homem amortecido que não
conseguia chorar no funeral da mãe dele, que
matou um árabe ou dois sem nem mesmo saber por quê -
ele prosseguia e prosseguia
e prosseguia e prosseguia
contando-me que filho de uma puta era O estrangeiro,
e fiquei pensando que talvez ele tivesse razão -
você sabe, esses discursos horrorosos diante da Academia Francesa -
você não saberia dizer se Camus estava falando pelo
canto da sua boca ou
se ele estava
sério. ele certamente não soava melhor que
o sujeito a meu lado no bar
e nós estávamos apenas procurando
xota.
foi muito triste -
o tempo todo O estrangeiro havia sido meu herói
porque eu achava que ele enxergara para além da tentativa
ou do cuidado
porque tudo era uma tamanha chatice
tão sem sentido -
a vida em um grande buraco no chão olhando para cima -
e eu estava errado mais uma vez:
inferno, eu era O estrangeiro e o livro simplesmente não havia saído
do jeito que
deveria.
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Abandono da Luta

cometeram seu primeiro erro quando
deitaram o campeão
de cara para baixo
na mesa do vestiário -
foi um grito de
câncer -
e então ele os amaldiçoou em italiano de
gente pobre e disse
me virem me virem me virem seus bundões
me virem,
e eles o fizeram
e ele disse,
ele quebrou todas as costelas do meu lado esquerdo
é um assassino, não é um lutador,
e então ele
disse,
olha, me arranje uma arma, eu vou matar aquele filho de uma
puta.
vá com calma, campeão, disse seu empresário, não foi pelo título, você
ainda tem o título. você pode derrotá-lo
na revanche. não assinamos o contrato para
lutar com Sondelle ainda. vamos adiar com
Sondelle e pegar esse cara na
revanche.
eu não vou lutar com esse assassino outra vez, disse o
campeão,
deviam banir esse chupador de paus nojento do
ringue.
veja, campeão, disse o empresário, não seja
estúpido, vamos conseguir uma bilheteria
grande para a próxima
luta, vão querer ver se ele pode
fazer isso de novo.
o campeão os amaldiçoou em italiano e depois disse,
nunca mais vão conseguir me colocar no ringue com esse
assassino outra vez.
olha, campeão, ele é um vagabundo eu lhe digo, um vagabundo, ele
nunca
bateu em ninguém antes, na próxima vez você
se prepara, larga a bebida e as fodas por
uma semana, ele não conseguirá
tocá-lo quando você estiver bem. ele não pode bater em você porra
nenhuma, campeão.
ele me
bateu. nunca vou tomar outra surra como essa de
ninguém.
você vai abandonar, campeão? você vai abandonar?
vou lutar com qualquer um menos
com esse cara.
tudo certo.
então, está bem, que tal um raio X das minhas
costelas? não consigo respirar, de verdade,
sinto-as cutucando meu
pulmão.
eles o retiraram dali e o levaram em uma
longa e negra
limusine baixa
ao hospital particular onde o
raio X não mostrou
nenhuma fratura.
eles estão mentindo, berrou o campeão, esses porras desses
idiotas estão mentindo! você não acha que eu
consigo sentir meus próprios ossos quando estão
quebrados?
ninguém disse nada.
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4 Quarteirões

levei minha filha de carro até o auditório da escola
onde sua mãe deveria encontrá-la
as 5 da tarde.
eu a deixei descer do carro
e ela enfiou a cabeça pela janela
e me beijou
como sempre fazia.
ela estava com 8 anos. eu com 52.
duas mulheres gordas ficaram nos observando.
eu acenei até logo para minha filha
e enquanto ela caminhava até a entrada
uma das mulheres gordas perguntou-lhe,
"espere um minuto, quem era esse homem?"
e ela respondeu, "esse é meu pai".
então uma das gordas correu na minha direção:
"espere um minuto, pode me dar uma carona, só 4
quarteirões?"
"meu carro é muito sujo", eu disse.
"não quero me intrometer", ela disse,
entrando.
"é só seguir pela rodovia. não é longe."
segui pela rodovia.
"Marina", ela disse, "é uma menina muito boa, nós
todas gostamos de Marina."
"sim", eu disse, "ela é uma garota muito quieta e
educada."
"sim," ela respondeu, "sim, ela é."
"costumo ser muito quieto e atencioso também",
eu disse.
"bem", ela respondeu, "acho que se você não se
elogiar, então ninguém vai fazer isso, hahaha!"
"está ventando muito hoje", eu disse.
"agora", ela disse, "vá dois quarteirões para o norte, então vire
à direita."
"tudo certo", eu disse, "vou fazer."
"espero", ela disse, "que não o esteja levando para muito longe
do seu caminho. espero não estar me
intrometendo.
"a senhora conheceu a mãe de Marina?", eu perguntei.
"ah, sim", ela disse, "é uma pessoa adorável, mesmo,
uma pessoa adorável."
"tem certeza de que mais ninguém vai?" eu perguntei.
"vai o quê?", ela perguntou.
"elogiar você se você não se elogiar a si mesmo", eu
respondi.
"bem", ela disse, "são mais 3 quarteirões,
então o senhor dobra à direita."
eu subi 3 quarteirões e dobrei à
direita.
"agora", ela disse, "está vendo esse caminhão com a porta
bem aberta?"
"estou vendo", eu disse.
"é só o senhor parar bem ao lado do caminhão e eu
desço do carro."
estacionei ali e ela desceu
do carro.
"com certeza quero lhe agradecer", ela disse,
"e espero não me haver
intrometido."
"eu a vejo por aí", eu disse.
"cuide-se bem."
eu segui em frente e entrei de novo à direita
em uma rua de mão única. o oceano estava
lá. não havia nenhum veleiro
à vista. vagamente eu pensei em
peixes voadores
e os dispensei como um mito.
fiz o balão
na primeira oportunidade
e segui de volta
para Los Angeles.
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Dois Tipos de Inferno

frequentei o mesmo bar por 7 anos, das 6 da manhã
até as 2 da madrugada.
às vezes eu não me lembrava de haver voltado
para meu quarto.
era como se eu ficasse sentado naquela banqueta do bar
continuamente.
eu não tinha dinheiro mas de algum modo os drinques iam
chegando.
eu não era o palhaço do bar mas sim o
louco do bar.
mas com frequência um louco pode encontrar alguém ainda mais
louco para
lhe oferecer bebidas.
afortunadamente,
era um lugar
cheio de gente.
mas eu tinha um objetivo: eu estava esperando que
algo extraordinário
acontecesse.
mas enquanto os anos se passavam à deriva
nada acontecia a não ser que eu
provocasse.
um espelho de bar quebrado, uma luta com um gigante
de mais de dois metros, um flerte com uma lésbica,
a habilidade de dar nome aos bois e de
resolver discussões que eu não havia
começado etc.
um dia eu simplesmente me levantei e caí fora.
simples assim.
e quando comecei a beber sozinho achei minha própria companhia
mais que satisfatória.
então, como se os deuses estivessem chateados por minha paz de
espírito, as mulheres começaram a bater à minha porta.
os deuses estavam mandando mulheres para o
louco!
as mulheres chegavam uma por vez e quando uma ia embora
os deuses imediatamente - sem dar nenhuma folga - me mandavam
outra.
e cada uma delas parecia à primeira vista ser um milagre renovado, mas
então tudo
que à primeira vista parecia maravilhoso acabava
mal.
minha culpa, é claro, era o que elas habitualmente me
diziam
os deuses simplesmente não deixarão um homem beber sozinho; eles têm
ciúmes dos
prazeres simples; assim eles mandam que uma mulher vá
bater em sua porta.
lembro todos aqueles hotéis baratos; era como se todas as mulheres
fossem uma; a primeira batida delicada na madeira e então,
"oh, ouvi você tocando aquela música adorável em seu rádio. somos
vizinhos. moro aqui no 603 mas nunca o vi
no saguão antes!"
"entre?
e lá se foi sua reclusão.
você também se lembra da vez em que
subiu atrás do gigante de 2 metros e derrubou seu
chapéu de caubói, berrando,
"aposto que você é alto demais para chupar os
peitos da sua mãe!"
e alguém no bar dizendo, "ei, senhor, esqueça, ele é um caso
psiquiátrico, é um chato, ele não sabe o que está
dizendo!"
"sei EXATAMENTE o que eu estou dizendo e vou dizer de novo,
"aposto que você é alto demais...""
ele ganhou a briga mas você não morreu, não do modo como você
morreu por dentro depois
de os deuses arranjarem para que todas aquelas mulheres viessem bater à
sua porta.
a troca de socos foi mais justa: ele era lento, estúpido e estava até um
pouco
assustado e a batalha foi a seu favor por algum tempo
do mesmo modo como aconteceu no começo com aquelas mulheres que
os deuses
lhe mandaram.
a diferença sendo, eu resolvi, que ao menos tive uma chance com as
mulheres.
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Meu Fiel Servo Índio

eu me virei para acender
a luz. a luz já estava
acesa. eu não estava legal. "Hudnuck!"
berrei para meu fiel servo
índio. "vá chupar meu saco," ele respondeu.
na luz mortiça
eu o vi no sofá com
minha mulher. eu saí
e toquei minha corneta.
3 camelos responderam a meu chamado e vieram
correndo atravessando o quintal.
"Hudnuck!", eu berrei.
"segure a sua onda, paizinho", ele respondeu,
"até eu acabar."
toquei minha corneta. nada aconteceu.
estava cheia de cuspe e
lágrimas.
Hudnuck apareceu na
varanda, fechando seu zíper.
"quero um aumento", ele disse,
"estou trabalhando para nada."
"e eu estou vivendo para nada, Hud:
você não percebe que
eu estou acabado?"
"não fale assim", ele disse,
"você tem uma boa mulher."
minha mulher apareceu na
varanda, "o que você vai querer para
o desjejum, querido?", ela
perguntou.
"bacon e ovos", eu respondi.
"você não, seu maluco!", ela gritou.
"bife e salsicha de fígado", disse
Hudnuck.
"obrigada, querido", disse minha boa
mulher, retornando a nosso
ninho.
toquei minha corneta. um corvo respondeu.
Hudnuck arrancou a corneta
da minha mão. ele a esfregou
na frente da minha melhor
camisa. (ele a estava
usando.)
ele tocou "Hearts and Flowers"
na maldita coisa. meus olhos
ficaram marejados de lágrimas.
resolvi dar-lhe um
aumento. olhando sobre o ombro, eu o vi
retorcer minha cometa até que ela
tomasse a forma de uma cruz
enquanto ele tocava "It Ain't Gonna
Rain No More".
ele tinha mãos fortes, delicadas,
belas. olhei para minhas próprias
mãos, primeiro não consegui achá-las, então
rapidamente
eu as tirei dos meus bolsos
eo
aplaudi.
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O Cavalo 7

dois velhos atrás de mim estão conversando.
"olhe o cavalo 7. dá pule de 35.
como é que pode, pule de 35?"
"é, para mim também parece bom", diz
o outro velho.
"vamos apostar nele."
eles se levantam para fazer as apostas.
já apostei 40 na ponta
no segundo favorito.
ganho a cada quatro de cinco dias na
pista de corridas. não parece ser
um problema.
abro meu jornal, leio o caderno de
finanças, fico deprimido, mudo para a primeira
página procurando roubo, estupro, assassinato.
os dois velhos voltam.
"olha, o cavalo 7 agora dá pule de 40",
diz um deles.
"não acredito!", diz o
outro.
os cavalos vão para a partida, a
bandeira se ergue, eles
saem.
é uma milha e 1/16 avos, eles
dão a primeira volta, correm pela reta,
dão a última volta, seguem pela reta final,
alcançam a chegada.
o 20 favorito ganha por uma cabeça, paga
$7,80. eu ganho $116,00.
há silêncio atrás de mim.
então um dos velhos diz, "o cavalo 7
não correu nada".
"nada", diz o outro. "não consigo entender
isso."
"vai ver o jóquei nem tentou", diz
seu amigo.
"deve ser isso", diz
o outro.
como a maioria dos outros do mundo
eles acreditam que o fracasso
é causado por algum fator
para além deles.
observo os dois velhos enquanto eles
se debruçam sobre o boletim das corridas
para fazer uma seleção no
próximo páreo.
"ih, olha essa!", diz um deles.
"tem Red Rabbit com 10 para 1
na lista. ele parece melhor
que o favorito."
"vamos apostar nele", diz o outro
velho.
eles deixam seus lugares e se movem delicadamente até o
guichê de apostas.
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O Suicídio

eu havia recentemente enterrado uma mulher com a qual vivi
por três anos
estava entre empregos
meus dentes apodrecendo na minha boca
(liquidei a dor com aspirina e
cerveja)
eu estava sentado no sofá quebrado
olhando o entardecer transformar-se em noite
quando o telefone tocou.
era Morrie.
"sim, Morrie?"
"ouça, Mark está aqui. ele diz que tem que
vê-lo! ele diz que vai cometer
suicídio!"
"ponha-o na linha..."
"não, ele não pode falar, ele
pirou!"
pisei em uma barata que passava.
"passe-me seu pai", eu lhe disse.
Bernie pegou o fone.
"escute, Bernie", eu disse, "que besteira
é essa sobre Mark?"
"é verdade! ele disse que se você não
vier já para cá ele vai se matar!
ele precisa de ajuda, Hank!"
"você acha que ele realmente vai
fazer isso?"
"eu não brincaria com uma coisa
dessas!"
"é longe até San Bernardino."
"são apenas 50 milhas! você pode fazer
em 45 minutos."
"tudo certo, Bernie..."
terminei minha cerveja, andei até meu
carro velho de 12 anos.
deu partida e peguei a
autoestrada.
foi uma viagem longa, sombria e estúpida.
Mark era uma dessas pessoas que
sempre insistiam que nossa amizade
era de verdade
pouco importando quanto esforço eu
fizesse para
ficar longe dele.
eu finalmente parei na frente da
casa.
desci do carro, bati na porta.
Morrie atendeu à porta.
ele tinha um tique na cabeça.
quando algo o aborrecia sua
cabeça começava a pular.
ela estava pulando por toda a
entrada da casa.
"Mark tem estado conosco",
ele disse, "pelas últimas duas
semanas."
entrei.
Mark estava sentado no sofá
segurando uma cerveja.
sorriu para mim.
estava usando o velho roupão
de Bernie.
não aparentava
estar
contemplando
suicídio.
"onde está seu pai?", perguntei
a Morrie.
"foi dormir. foi para a
cama. ele não está
passando bem."
"são apenas 7: 30."
"ele não está passando bem."
eu me sentei. havia um fogo aceso
na lareira.
"que tal uma cerveja?", Morrie perguntou,
sua cabeça pulando.
"com certeza. cadê sua mãe?"
"ela não está em casa."
Mark pigarreou. então, em sua
voz calma, começou a falar sobre a
escrita dele: agora estava fixado em serial killers. ele
havia escrito um romance. tinha uma
agente. fora vê-la naquela
tarde. ela tinha uma piscina.
haviam nadado juntos na piscina. ela
era um pedação de mulher com grandes conexões.
entendia que sua escrita era excepcional.
ela ia assumir sua carreira e
torná-lo famoso e...
desliguei enquanto ele seguia em frente e seguia em frente.
ele estava usando um lenço de seda ao redor de seu pescoço
gordo.
terminei minha cerveja e Morrie levantou-se de um pulo,
a cabeça saltitando, e me deu outra.
então ouvi de novo a voz de Mark. "sua
escrita me lembra muito a
minha!"
Morrie me deu a cerveja. tomei um bom
gole e olhei a lareira. um
pedaço de madeira estalou naquele momento, uma
fagulha vermelha se soltou, subiu e caiu
para trás.
aquilo foi bonito. aquilo foi bonito e de algum modo
tranquilizador
"gostaria que você lesse um capítulo do meu
romance", Mark disse. "você tem aquela pasta
azul, Morrie?"
Morrie tinha. ele a pôs cuidadosamente em meu
colo.
eu a abri, fui para a primeira página
e comecei a ler...
Mark não sabia escrever, nunca soube.
eu continuei lendo, meus dentes começando a doer.
perguntei para Morrie,
"você tem algum uísque?"
Morrie foi buscar enquanto Mark permanecia sentado ereto
no roupão velho de Morrie, esperando
por minhas palavras de elogio.
eu acharia um jeito de deixá-lo pra lá facilmente
tomara que
sem mentir.
o uísque chegou e tomei um trago
segui na leitura
bebendo
olhando o fogo.
a cabeça de Morrie continuava a pular.
por que certos indivíduos nunca percebem o quanto
são chatos?
ou eles sabem e simplesmente não
ligam?
continuei a ler, desesperançada-
mente.
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lingua de boi

eu não havia comido por alguns dias
e havia mencionado isso várias vezes
e havia chegado à casa daquele poeta
onde uma mulher minúscula tomava conta dele.
ele era um cara grande e barbado com um cérebro duas vezes o tamanho
do
mundo, e havíamos passado a noite toda sem dormir
escutando gravações, conversando, fumando, tomando pílulas.
sua mulher havia se deitado há horas.
eram 10 da manhã
e a luz do sol entrava sem ligar se não havíamos dormido
e quando vi
ele saía da cozinha
dizendo: "Hei, Chinaski! OLHE!"
não conseguia enxergar direito -
primeiro parecia uma bota amarela cheia d'água
e depois parecia um peixe sem cabeça
e depois parecia o caralho de um elefante,
e ele fez aquilo chegar mais perto:
"língua de boi! língua de boi!"
ele segurou com o braço estendido
bem na minha cara:
"LÍNGUA DE BOI! LÍNGUA DE BOI!"
e era, e eu nunca havia imaginado que a língua de um novilho fosse tão
grande e gorda,
havia sido um estupro,
haviam entrado fundo na garganta da criatura
e arrancado para fora, e estava ali agora:
"LÍNGUA DE BOI!"
e era amarela e rosada
e
a coisa se havia engasgado em si mesma
só mais uma atrocidade razoável e sensível
cometida por homens inteligentes.
eu não era um homem inteligente. eu
consegui chegar à pia e começaram as
náuseas.
estúpido, é claro, estúpido, era só carne morta,
sem sentir nada agora, a dor há tempos havia escorrido pelo fundo do
mundo
mas continuei a vomitar, terminei, limpei a pia
e voltei
"desculpe", eu disse
"tudo certo, esqueci sobre seu estômago."
então ele levou a língua de volta para a cozinha
e depois retornou à sala e conversamos sobre isso e aquilo
e em uns dez minutos
ouvi a água fervendo e senti o cheiro da língua a cozinhar
naquela água borbulhante sem boca ou olhos
ou nome, era uma língua enorme dando voltas e mais voltas
debaixo daquela tampa
e fedendo
tornando-se língua cozida
tornando-se mais deliciosa e aromática
mas como ele era um sujeito agradável
eu pedi para desligar aquilo por favor.
era uma manhã fria e senti calafrios junto à porta
enquanto me preparava para ir embora
o ar fresco era bom
eu podia sentir as pernas o coração os pulmões
começando a vislumbrar uma outra chance.
conversamos sobre um livro de poemas que ele me estava ajudando
a editar, então eu disse "até logo, vamos
ficar em contato", e não apertamos as mãos, algo que nenhum de nós
gostava de fazer
e subi pelo caminho até meu carro e dei partida
e enquanto esquentava imaginei-o voltando para
a cozinha por trás da massa de barba negra,
aqueles olhos de diamante azul brilhando no meio
de todo aquele cabelo negro
aqueles olhos de diamante azul inteligentes e felizes
sabendo tudo (quase), e então
acendendo novamente o fogo
a água começando a borbulhar e assobiar
a língua dando voltas lá dentro
mais uma vez.
e eu, estúpido em meu carro, afastei-me do
meio-fio, deixei-o rodar através da manhã amarela,
descendo pelas curvas e encostas,
todo aquele verde crescendo lindamente ao longo da beira
do caminho.
bem,
graças a Deus ele não me convidou para ficar para
jantar, quando cheguei em casa folheei algumas
reproduções de
Renoir, Pissarro e Diaz,
então comi um ovo
cozido.
 

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Os Anos 1930

lugares para caçar
lugares onde se esconder estão
cada vez mais difíceis de achar, e bichos de estimação
canários e peixes dourados também, você já reparou
nisso?
lembro quando salões de bilhar eram salões de bilhar
e não só mesas em
bares;
e lembro quando as mulheres da vizinhança
costumavam cozinhar panelões de came ensopada para seus
maridos desempregados
quando suas barrigas doíam
de medo;
e lembro quando crianças costumavam olhar a chuva
por horas e
brigavam interminavelmente por um filhote
de rato; e
lembro quando os boxeadores eram todos judeus e irlandeses
e nunca davam a você uma
luta ruim; e quando os biplanos voavam tão baixo que
dava para ver a cara do aviador e seus óculos de proteção;
e quando uma barra de sorvete em cada dez tinha dentro um bilhete
de sorteio; e quando por 3 centavos dava para comprar doces o bastante
para fazê-lo passar mal
ou durar toda uma
tarde; e quando as pessoas da vizinhança criavam
galinhas em seus quintais; e quando recheávamos um automóvel
de brinquedo de 5 centavos com
cera de vela para fazê-lo durar
eternamente; e quando montávamos nossas próprias pipas e patinetes
e lembro
quando nossos pais brigavam
(dava para ouvi-los por quarteirões)
e eles brigavam por horas, gritando maldições pesadas
e os guardas nunca
vinham.
lugares para caçar e lugares para se esconder,
eles simplesmente não estão mais
por aí. lembro quando
cada 40 lote estava vago e cheio de mato, e o senhorio
só recebia seu aluguel
quando você tinha
como pagar, e cada dia era claro e bom e cada momento era
cheio de promessas.
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Pessoas Como Flores

que cantoria prossegue nas
ruas -
as pessoas parecem flores
finalmente
a polícia guardou suas
insígnias
o exército rasgou seus uniformes e
destroçou suas armas. não há mais necessidade de
cadeias ou jornais ou hospícios ou
trancas nas portas.
uma mulher vem correndo até minha porta
ME COMA! ME AME!
ela grita.
ela é bela como um charuto
depois de jantar um bom filé. eu
a possuo.
mas depois de sua partida
eu me sinto esquisito
tranco a porta
vou à escrivaninha e pego a pistola
da gaveta. ela tem seu próprio senso de
amor.
AMOR! AMOR! AMOR! a multidão canta nas
ruas.
eu atiro pela janela
o vidro corta meu rosto e
braços. acerto um garoto de 12 anos
um velho de barba
e uma adorável moça algo parecida a uma
violeta.
a multidão para de cantar para
me olhar.
estou parado na janela quebrada
o sangue em meu
rosto.
"isso", eu grito para eles, "é em defesa da
pobreza de si mesmo e em defesa da liberdade
de não amar!"
"deixe-o em paz", alguém diz,
"ele está louco, viveu uma vida ruim por
tempo demais."
entro na cozinha
sento-me e encho um
copo de uísque.
resolvo que a única definição da
Verdade (que muda)
é ela ser a única coisa ou ato ou
crença que a multidão
rejeita.
estão socando minha
porta. é a mesma mulher de novo.
ela é tão bela como encontrar um
sapo verde e gordo no
jardim.
eu tenho 2 balas restantes e
uso
ambas.
nada no ar a não ser
nuvens. nada no ar a não ser
chuva. a vida de cada homem é curta demais para
encontrar sentido e
todos os livros quase um
desperdício.
sento e os ouço
a cantar.
sento e os
ouço.
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aula noturna, 20 anos depois

a pressão famélica de ser tarde demais;
teias de agulhas,
as mesmas árvores estão aqui;
e grama crescida sobre a grama
mas os rostos agora são jovens
e enquanto você caminha pelo campus pensando
"memória é uma pobre desculpa para o presente"
as pernas querem deixar que o corpo caia enquanto
velhas imagens grudam em você como moluscos
e as garotas que agora se foram e que antes
pediam por sua substância
agora pendem como cortinas rasgadas
pelas janelas da sua mente;
- houve um tempo aqui
em que tudo era meu -
agora jovens leões reivindicam o território
e olham distraidamente
suas patas frouxas
e resolvem
misericordiosamente
deixar essa pobre presa passar. ele, é claro,
não é páreo para as jovens leoas,
ou a primavera no céu matinal.
uma vez aqui -
uma vez -
eu entro na sala e fico em pé contra a parede
e ouço meu nome ser lido, e
não, não é a mesma coisa:
meu velho professor parecia um leão-marinho
quando escarrava meu nome
na escarradeira do mundo
e eu dizia PRESENTE! enquanto
sentia o sol a escorrer
pelos cabelos da minha cabeça
como fios alimentando vida com vida:
chuva branca, mar bravo;
mas esse novo sussurra meu nome (e está escuro);
e como uma garra pegando algo profundo em mim,
rodeado por paredes como túmulos eu respondo de modo dócil:
presente,
e ele passa para outro nome.
sou mais velho que ele
e certamente não tão afortunado
enquanto as leoas se enrodilham a seus pés e ronronam prazerosamente,
e um velho gato cinza
vira O pescoço
e me pergunta: você já esteve aqui antes?
sim, sim, sim, sim
eu já
estive aqui
antes.
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A Vida na Agência De Correios

eu me agacho diante desse labirinto
de caixotes de madeira
enfiando pequenos cartões e cartas
endereçados a inexistentes
vidas
enquanto a cidade toda comemora
e fode pelas ruas e canta
com os pássaros.
eu fico parado debaixo de uma fraca luz elétrica
e mando mensagens para um Garcia falecido,
e tenho idade suficiente para morrer
(sempre tive idade suficiente para morrer)
enquanto fico parado diante dessa bagunça de madeira
e alimento sua fome muda;
este é meu trabalho, meu aluguel, minha puta, meus sapatos,
o escorrer da cor dos meus olhos;
chefe, foda-se, você me achou,
minha boca franzida,
minhas mãos enrugadas contra meu
peito branco com manchas vermelhas;
a rua é tão dura, ao menos
dê-me o descanso pelo qual paguei uma vida,
e quando o Gavião chegar
eu o encontrarei no meio do caminho,
nos abraçaremos lá onde o papel de parede está rasgado
onde a chuva entrou.
agora estou parado diante de um cemitério de olhos e bocas
de cabeças esvaziadas para sombras
e sombras entram
como ratos e me olham.
eu remexo em cartões e cartas com números secretos enquanto
agentes cortam os fios e testam meu batimento cardíaco,
para escutar sanidade
ou alegria ou amor, e sem acharem nada,
satisfeitos, vão embora;
flap, flap, flap, estou parado diante do labirinto de madeira
e minha alma desfalece
e além do labirinto há uma janela
com sons, grama, caminhada, torres, cães,
mas aqui estou e aqui fico,
enviando cartas com minha própria demissão;
e eu estou cansado de me importar: ir embora, largar tudo,
e tocar fogo.
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Estrangeiro Em Uma Cidade Estranha

eu havia acabado de chegar
a outra cidade estranha
e havia deixado meu quarto e
me encontrava caminhando ao longo
do que devia ter sido
uma avenida principal
na qual os automóveis corriam indo
e vindo com o que parecia ser
um propósito
definido.
aquele bulevar movimentado parecia
estender-se sem fim
à minha frente e
parecia seguir
direto até a beirada
da Terra,
e então
depois de caminhar por um tempo
eu me dei conta
de que estava
perdido, de que
havia esquecido o nome
da rua em que meu
quarto ficava
ou
onde estava.
não havia deixado nada
naquele quarto
a não ser a diária paga
por uma semana
mais uma mala
amarrotada
cheia de minhas roupas velhas
mas aquilo era
tudo o que
eu tinha
então comecei a examinar
as travessas
procurando
meu quarto
e logo fiquei
com medo, um
terror paralisante como uma doença
fatal
espalhando-se em mim
enquanto
eu continuava a andar
para cima e para baixo por ruas
desconhecidas
até que minha mente
me dissesse:
você está louco, é só
isso, você deveria
desistir e tentar
resolver
isso.
mas eu só continuava a andar.
havia sido uma
longa tarde e agora
deslizava
noite adentro.
meus pés doíam
em meus sapatos
baratos.
então foi
escurecendo, já era noite,
mas eu continuei
a caminhar.
sentia como se
tivesse caminhado
para cima e para baixo
pelas
mesmas ruas
de novo e de novo.
então finalmente
reconheci meu
prédio!
e subi correndo
os degraus
e pela escadaria até
o segundo andar
e meu quarto ainda estava
láeeu
abri a porta,
fechei-a depois de entrar,
e fiquei
seguro lá dentro.
lá estava a
mala
no assoalho,
ainda cheia das minhas
roupas velhas.
eu ouvi um homem
rir
em outro
dos quartos e subitamente
me senti muito
melhor.
eu tirei meus sapatos,
camisa, calças,
sentei-me na beirada
da cama e
enrolei um
cigarro.
e aí me reclinei no
travesseiro e
fumei.
eu tinha 20 anos de idade
e 14 dólares
na minha carteira.
então me lembrei
da minha garrafa de vinho.
puxei-a sob a
cama, destampei-a
e tomei um bom
trago.
resolvi que
não estava louco.
peguei um jornal
do chão
e fui para a seção de
empregos:
lavador de pratos, auxiliar
aduaneiro, estoquista,
guarda noturno...
joguei o jornal
no chão.
eu procuraria um
emprego
depois de
amanhã.
então apaguei
o cigarro
satisfeito
e fui
dormir.
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Só Mais Um Bebum

o garoto tinha 20 anos, estivera na estrada
por 5 ou 6 anos e agora estava sentado no sofá
tomando minha cerveja, seu nome era Red,
e ele falava sobre a estrada:
"aqueles 2 caras estavam tentando me amedrontar
para valer, fazer com que eu ficasse quieto, porque eu tinha visto eles
matarem um
cara".
"matarem um cara? como?"
"com uma pedra."
"para quê?"
"ele tinha sua carteira, uma boa
carteira, e 7 dólares. era um bebum. estava
bebado e bateram nele com a pedra,
arrebentaram seus miolos."
"você viu isso?"
"eu vi. na próxima parada do trem
eles o descarregaram, descarregaram em algum
mato alto, aí o trem partiu
de novo."
dei mais uma cerveja para o garoto.
"quando a polícia encontra esses caras esfarrapados, sem
identificação, cara avermelhada de vinho, eles dizem "só mais um
bebum",
nem investigam, só
esquecem."
conversamos quase a noite toda
sobre a estrada. eu lhe contei umas histórias
minhas. então fui para a cama. ele dormiu no
sofá. eu entrei no quarto de dormir com a mulher e
a criança. dormi.
quando acordei para mijar pela manhã
Red estava sentado em uma cadeira
lendo jornal de ontem.
"preciso ir", ele disse, "não posso dormir
mais, mas tive uma boa noite, foi uma boa
conversa. obrigado."
"eu também, Red. vá com calma."
"com certeza."
então ele saiu pela porta e seguiu pela rua,
partiu.
de volta ao quarto, ela perguntou, "Red foi embora?"
"para onde ele foi?"
"não sei. Texas. O inferno. Boston. qualquer lugar."
a menininha acordou:
"eu quero mamar!"
"você pode pegar a mamadeira para ela? você está em pé."
"claro."
eu fui para a cozinha e misturei algum
leite. e em todo lugar todas as coisas iam correndo,
cruéis e não cruéis, aranhas e vagabundos
e soldados e jogadores e loucos e
factótuns e bichas e bombeiros, assim mesmo,
e voltei para o quarto e passei a mamadeira para a menina
voltei para a cama
e ouvi a criança chupando aquela coisa -
chupa chupa chupa,
e logo nós tomaríamos nosso próprio
café da manhã.
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Pode Ir Dando Adeus a Sua Bunda

eu finalmente o conheci. ele estava sentado em um velho roupão
e reclamou por 5 horas.
"olha," ele disse, "não confie em Krause,
Krause irá roubá-lo. ele me deve 10.000 dólares
e não tem jeito de eu arrancá-los
dele. um verdadeiro safado."
"Senhor", eu disse, "quando escreveu aquele primeiro romance,
tinha tanto humor, a verdade sempre é tão engraçada,
sabe, o jeito como as pessoas agem, como coisas mecânicas cegas,
matando sem razão, maravilhoso como conseguiu por tudo aquilo
no papel."
uma velha senhora entrou e serviu-lhe uma
xícara de chá. "eles arrebentaram minha motocicleta, roubaram meus
manuscritos,
me limparam. eles teriam me matado mas eu não estava
aqui. eles me chamaram de fascista, afirmaram que eu havia vendido os
planos
da Linha Maginot aos Krauts. agora, onde diabos eu poderia ter
conseguido os planos da Linha
Maginot?"
ele serviu-se de chá. ergueu a xícara. estava quente demais
ou algo assim. ele cuspiu tudo no tapete, um pouco em
meus sapatos e calças.
"Senhor", eu perguntei, "aquele primeiro romance, o senhor realmente
comeu sua própria
carne quando era um jovem escritor? estava tão
faminto assim? meu deus, que narrativa aquela, eu nunca
a esquecerei!"
"Martha!", ele chamou. "Martha!"
a velha senhora entrou.
"você esqueceu o limão e o açúcar, sua bruxa velha!"
a velha senhora saiu correndo
para pegar o limão e o açúcar.
"o governo reclama que eu lhe devo 70.000 dólares! eles não incomodam
Krause, o filho
da puta roda por aí em um Cadillac e tem uma propriedade
de cinco hectares. nunca confie em Krause. ele é um sanguessuga. ele
sugou
os corpos e talento de pelo menos 3 dúzias de escritores. ele é como uma
aranha
gigante, uma tarântula!
"Krause nunca me pediu nada..."
"se ele pedir, você pode ir dando adeus
a sua bunda!"
Martha entrou correndo com o limão e o açúcar.
"sua maldita puta sem vergonha! eu deveria chicotear sua bunda!"
"Senhor", eu disse, "o senhor é visto como
um dos mais poderosos escritores desde 1900."
"não confie em Krause! um sanguessuga!?"
ele se queixou por 5 horas. e eu ouvi. então sua cabeça caiu para trás,
sobre o encosto da sua cadeira de balanço, e eu vi aquele
famoso perfil de águia. então ele começou
a roncar.
ele era apenas um velho em um velho
roupão.
eu me levantei. Martha entrou.
"estou contente por ter tido uma chance de encontrá-lo",
disse a ela.
"tento lembrar-me de que ele já foi um grande escritor",
ela me disse.
"ele ainda tem um certo senso de humor",
disse a ela.
"eu não acho", ela disse,
"veja, eu sou
a mulher
dele."
"boa noite", eu
disse.
"boa noite", ela
respondeu.
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Brilho Roxo

vejo os sapatos
de salto alto e uma rosa branca murcha
que jaz no bar
como um punho
cerrado.
uísque faz o coração bater mais depressa
mas com certeza não ajuda a
mente e não é engraçado como você pode sentir dor
só com o mortífero rumor da
existência?
vejo essa
dançarina de striptease correndo ao longo do balcão
do bar
rebolando aquilo que ela acha
mágico
com todas aquelas caras encarando
por cima dos drinques
caros demais.
e eu? aqui? porra nenhuma,
realmente, não ligava para
ela mas amo a pulsação da
música alta e chapada tamborilando
no brilho roxo, qualquer
coisa sobre isso tudo: dificilmente
me senti melhor alguma vez.
eu a olho, a boneca
roxa tão
triste tão barata tão
triste, você nunca iria querer ir
para a cama com ela ou mesmo escutar sua
conversa, no entanto naquele lugar bêbado
você iria
gostar de passar seu coração para ela
e dizer
toque-o
mas depois
devolva-o.
ela dança tão vigorosamente agora no
brilho roxo,
o roxo mexe comigo de modo estranho:
houve uma noite
30 anos atrás
eu estava bêbado, é verdade, e havia
um Cristo roxo em uma caixa de vidro
do lado de fora de uma igrejinha e eu
arrebentei o vidro, eu quebrei
o vidro, e aí alcancei e toquei
Cristo mas
Ele era apenas um boneco e eu escutei as
sirenes em seguida e comecei
a correr.
bem, minha mente nunca mais foi €a mesma
desde então e bater à máquina ajuda mas você não pode
bater à máquina o tempo todo, assim a dançarina de striptease agora
parte o que sobrou do meu coração e eu
não sei por que mas começo a dar dinheiro
para todo mundo no bar, dou uma nota de cinco para esse
cara, uma de dez para aquele, acho que talvez possa
despertá-los para a sabedoria
disso tudo
mas eles nem sequer dizem
"obrigado", acham que sou apenas um
louco.
o gerente chega e diz
que estou expulso dali, passo-lhe uma nota de
vinte, ele a
pega.
dois amigos
estavam sentados em uma mesa
dos fundos, eles me ajudam a levantar e sair do
bar.
acho a situação muito
engraçada mas eles estão
furiosos:
cadê o seu carro?
cadê a porra do seu
carro?
eu digo, eu
sei lá.
que merda, eles
dizem e
me deixam sentado sozinho
nos degraus de
um prédio
de apartamentos.
acendo e fumo um cigarro.
depois me levanto e começo a longa
caminhada, uma caminhada que sei
que levará pelo menos umas duas
horas
até eu achar meu carro (experiência anterior)
mas eu sei que ao
encontrá-lo o turbilhão de
felicidade será
tudo de que preciso
e serei capaz de
recomeçar
a minha vida
mais uma vez.
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O Anão com um Soco

isto foi muitos anos depois
e ainda não consigo entender direito
mas foi em Nova York
e Nova York tem suas próprias leis e
de qualquer modo eu estava à toa em um daqueles
lugares
com muitas mesas redondas
com seus cavaleiros fortes e terríveis;
eu não me sinto tão bem assim, como de costume,
nem forte nem terrível,
apenas podre,
e eu estou sentado com alguma mulher
com alguma espécie de capuz sobre a cabeça,
ela é meio maluca
mas isso não importa.
ela tem um nome, Fay,
eu acho,
e ficamos bebendo, indo de um lugar a
outro, e entramos lá,
e parecia terrivelmente
animado
pois havia um anão com cerca de um
metro de altura
e o anão estava circulando
bêbado
e ele parava em uma mesa
e olhava para um homem
e dizia,
"bem, o que VOCÊ tem para dizer?"
e depois o anão lhe acertava uma na boca
só que o anão tinha mãos muito boas e
um soco infernal
então todo mundo dava risada e o anão
seguia para o bar
para mais um drinque.
"mantenha-o longe de mim, Fay!", eu lhe disse.
"ah? o quê? quem?"
"mantenha-o longe de mim!"
"quê? o que é? longe?"
o anão mandou a mão em outro sujeito
e todo mundo riu,
até eu ri. o anão sabia socar.
ele tinha muita
prática.
ele dançou no bar
estilo pé de valsa
então ele reparou em um marinheiro
muito loiro e jovem e
amedrontado.
o garoto mijava nas calças
e sorria para O
anão.
o anão lhe mandou a mão
para valer;
seu sorriso seguinte foi um tanto
sangrento.
então o anão deu-lhe outra no queixo
jogando o marinheiro para trás
sobre sua cadeira, duro
e teso.
nocaute! todos saudaram
o campeão!
aí o anão me
viu. o homem da mesa
ao fundo.
"mantenha-o longe de mim, Fay!"
eu disse.
"vamo tomá outro drinque Pp? ela disse.
(estava com um copo cheio na frente dela)
ele veio para cima de mim
em todo o um metro da sua
glória.
"muito bem, o que VOCÊ tem para dizer?"
eu não respondi. eu não tinha nada para dizer
que ele pudesse entender.
"nada, hein?"
eu fiz que sim. ele veio. eu senti minha cadeira rodar, depois
parar de novo sobre seus pés. jorros de luz vermelha e amarela e
azul vieram em seguida, depois risadas.
sentado ali
eu revidei.
seu pobre um metro deslizou pelo chão como um
boneco de trapos
e então estavam em cima de mim
parecia uma dúzia de homens
(mas podiam ter sido 3 ou 4)
e tomei mais algumas
porradas.
então fui jogado para fora
eu me levantei
e achei um lenço
e tentei parar
o pior do sangue
e Fay estava lá,
"seu covarde, você bateu naquele
homenzinho!?"
eu desci pela rua
mas ela ficou lá junto comigo
e fomos ao bar mais próximo
e eu olhei ao redor
e, vendo que todo mundo tinha mais de 1 metro e 30,
mandei vir mais 2
drinques.
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Salty Dogs

fui cedo à pista para estudar as chances e aí
vem esse homem chegando e
limpando o pó dos bancos. ele prossegue em seu trabalho, tirando o pó,
muito
provavelmente contente por ter seu trabalho simples.
eu sou daqueles que não veem muita diferença
entre um cientista atômico e um homem que limpa os assentos
exceto pela sorte na jogada -
pais com dinheiro suficiente para dirigi-lo com segurança para uma
vida mais generosa.
"como é que vai?", perguntei-lhe enquanto ele ia tirando o pó.
"tudo bem, e como vai você?", ele perguntou.
"eu até que acerto com os cavalos. é com as mulheres que eu perco."
ele riu. "é, um homem tem duas ou três experiências ruins,
isso realmente o derruba."
"eu não ligo para duas ou três," eu lhe disse, "eu ligo para
11 ou 12."
"cara, você deve conhecer muita coisa nessa altura. qual você prefere
para o
primeiro?"
eu lhe disse que Salty Dog estava dando 4 para 1 e deveria chegar
em primeiro ou segundo. (45 minutos depois ele o fez.) mas ainda não
eram 45
minutos depois. o homem continuou a tirar o pó e eu pensei em todos os
meus empregos podres e como eu estava contente por tê-los. por um
tempo. depois era questão de largar ou ser demitido.
ambos me faziam sentir bem.
é quando você vive com uma mulher por mais de dois
anos que você sabe o que poderá acontecer só que você não sabe
exatamente por quê. não está no horóscopo. está no desempenho
passado,
não no horóscopo.
meu amigo, limpando o pó dos assentos, ele também não sabia
exatamente por quê.
saí para tomar um café. a garota magra atrás do
balcão era uma morena com uma pequena flor azul no cabelo,
belos olhos, belo sorriso. paguei meu café.
"boa sorte", ela disse.
"para você também", eu disse.
levei o café para meu assento, o vento vinha do oeste,
tomei um gole e esperei pela ação, pensando em
muitas coisas, coisas demais. a cena dissolveu-se em grama e
árvores e a pista suja de corridas, e me lembrei de cortinas sujas em
quartos sujos de pensão esvoaçando para a frente e para trás em um
vento leve,
e pensei em tropas sujas saqueando algum vilarejo novo,
e em minhas antigas namoradas infelizes novamente com seus novos
homens.
eu me sentei e tomei meu café e esperei pelo primeiro
páreo.
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Todas as Garotinhas

foi lá no norte da Califórnia
e ele estava em pé no púlpito
e estava lendo há algum tempo
estava lendo muitos poemas sobre
a Mãe Natureza e a bondade inerente
ao homem.
ele acreditava que tudo estava
certo com o mundo.
e não dava para reclamar dele:
era um professor de carreira que nunca havia
estado na cadeia ou em um puteiro;
cujo carro usado nunca morreu
na autoestrada; que
nunca havia precisado de mais do que
três drinques durante a mais louca
das suas noitadas;
que nunca havia sido fichado, execrado ou
levado porrada;
que nunca havia sido mordido por um cachorro;
que recebia regularmente cartas cordiais de Gary
Snyder, e cujo rosto era
amável, sem marcas e
carinhoso. finalmente,
sua mulher nunca o havia traído
muito menos sua sorte.
ele disse: "só vou ler
mais três poemas e depois vou
descer daqui e deixar
Chinaski ler".
"ah, não", disseram todas as
garotinhas em seus vestidos rosados e azuis
e brancos e cor de laranja
e lilases. "ah, não,
leia mais alguns, leia mais
alguns!"
ele leu mais um poema e então disse,
"este é o último poema que
vou ler".
"ah, não", disseram todas as
garotinhas em seus vestidos meio transparentes
vermelhos e verdes. "ah, não", disseram
todas as garotinhas em seus jeans
apertados com corações costurados neles.
"ah, não", disseram todas as garotinhas,
"por favor, leia
mais poemas!"
mas ele cumpriu sua palavra.
recolheu os poemas e desceu e
desapareceu em algum lugar. quando levantei-me para ler
as garotinhas deram risadinhas em
seus assentos e uma delas assobiou e
algumas delas fizeram observações interessantes dirigidas a mim
que usarei em um poema em alguma data futura
pois este maldito poema em particular
tem que terminar em algum lugar.
de qualquer modo, foi duas ou três semanas depois
que recebi essa carta do poeta William
dizendo que ele havia apreciado minha leitura.
ele era um verdadeiro cavalheiro.
eu estava de cama com uma
ressaca de três dias. perdi o envelope
mas peguei a carta e a dobrei em
um desses aviõezinhos de papel
que eu havia aprendido a fazer na
escola. navegou ao redor do quarto
e aterrissou entre um velho boletim de corridas de cavalo
e um par de shorts puídos.
não nos correspondemos desde então.
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Chega Desses Rapazes

meu primeiro marido, Retzel, ela disse,
voava em paragliders. ele tinha só uma das mãos.
ele nunca me chupou, nem uma vez só.
ele quer conhecê-lo, ele mora em
Redondo Beach.
Redondo Beach, eu disse, Redondo Beach.
meu marido seguinte,
Craft, tomava comprimidos e tocava piano o dia todo.
depois ele precisou operar um dos dedos da mão.
uma verruga. ele foi cruel comigo. agora ele sabe
o quanto foi cruel comigo.
onde ele está agora?
África. ele ainda está na África.
eu rodei pela África toda. circulei por lá
de barco. conheci um homem que tinha um
leopardo. ele costumava levar seu leopardo para
passear todo dia preso a uma corrente.
um dia ele não apareceu. seu leopardo o havia
comido.
essa é uma história engraçada.
eu também acho. você entende
as coisas. para mim chega desses rapazes,
desses corpos duros. eu quero você. você está no controle
de tudo.
eu estou?
sim, meu marido seguinte,
Larry, certa vez cobriu meu corpo com
pétalas de rosa. todas aquelas flores! foi
adorável, mas ele não fez amor comigo
outra vez por 2 anos. ele foi tão ruim como
amante. você é um grande
amante.
eu sou?
sim, você não gostaria de ir à Holanda?
não.
a Paris?
não.
à África?
não.
Redondo Beach?
não.
você é esquisito. não gosta de
viajar?
estou cheio disso.
você devia ter-me visto voar no paraglider de Retzel!
eu era boa naquele paraglider.
mas ele nunca me
chupava.
Retzel?
sim, agora ele é publicitário. ganha um bom
dinheiro.
algum dia eu vou lhe contar sobre minhas
mulheres.
não quero saber de suas
mulheres. não quero saber de
nenhuma
delas.
ela se virou na cama
oferecendo-me suas costas e seu
rabo.
garota, eu disse, conte-me mais sobre
Retzel.
ela se virou em minha
direção. você realmente quer
ouvir?
com certeza.
então ficamos deitados de costas
e ela me contou sobre Retzel
e eu ouvi.
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