stellarprince

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Professor aposentado, poeta, escritor e consultor pedagógico.

1950-02-24 Campo Belo, MG, Brasil
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Alguns Poemas

TRAVESSIA A CAVALO NA BALSA

Era final da década de 50, a vida no Morro Grande era demasiadamente pacata, passávamos dias sem ver a presença de uma pessoa estranha a família. Na divisa de nosso sítio havia uma estrada, mas dificilmente se via alguém passar por ela. Algumas vezes se via algum caminhante que ia a direção do Porto dos Mendes. A estrada, mais adiante, do outro lado do morro que ligava a Cidade e o Porto passava a velha Jardineira pela manhã indo para a cidade e a tardezinha ouvia se o ronco do motor cansado voltando. Um dia ou outro ouvia se o ronco do motor de algum caminhão ou a caminhonete “pick up William” de um fazendeiro lá da beira do rio que ia ou voltava da cidade. A noite sim se via, com mais freqüência, a luz ao longe, no pé da serra os carros que vinham da Rodovia Fernão Dias em direção a cidade de Boa Esperança. Do mais não se ouvia nem o barulho de avião cortando os céus. Mas a natureza era pródiga em pássaros e grande variedade de outros animais que quebravam a monotonia do lugar com seus cantos e sons específicos.
Raramente íamos ao povoado de Ribeirão ou Porto dos Mendes, a não ser quando meu pai precisava comprar alguma coisa na venda ou quando me mandava ir vender hortaliças no povoado - jiló, tomate, repolho ou outro produto de nosso sítio.
Logo de manha papai preparava duas *caçambas cheias dos produtos a serem vendidos, colocava na sela do cavalo e não esquecia da medida, uma lata de óleo vazia, para medir o produto. Acontece que eu sempre queria agradar aos fregueses e colocava sempre um pouco mais que a unidade da medida padrão (o litro). Quando chegava a casa sempre era questionado pelo resultado da venda que era sempre menos do previsto. Explicava que eu sempre colocava um pouco mais da medida para cativar as pessoas para de outras vezes comprarem de mim e não de outros. Lembro que isso justificava um pouco, mas não agradava totalmente papai.
O povoado era pequeno, muita gente possuía a sua própria horta, o que dificultava a venda, por isso às vezes ia até o povoado do Sapecado que ficava na outra margem do Rio Grande. Mas papai alertava sempre que eu deveria deixar o cavalo do lado de cá, no Porto para não ter que pagar duas passagens na Balsa.
Mas certa vez resolvi ir ao Sapecado a cavalo, era mais cômodo, tomei a Balsa e embarquei o cavalo também pagando duas passagens, papai não precisaria saber, o dia parecia estar produtivo já havia vendido boa parte e sabia que lá no Sapecado venderia o restante. Não havia o que se preocupar. Mas papai não poderia saber, pois certamente haveria uma boa bronca. Atravessei o rio com o meu cavalo e lá fui eu pelas poucas ruas que havia todo imponente levando meus produtos e oferecendo de casa em casa.
Qual não foi a minha surpresa ao passar pela praça, em frente à Capela vejo surpreso o tio Pedrinho lá aguardando a hora do horário da Balsa para o Porto dos Mendes. Não pude deixar de mostrar meu contentamento ao ver meu tio por lá, mas por outro lado subiu um arrepio de medo do que poderia acontecer se ele se encontrasse com meu pai e falasse que me encontrou no Sapecado e a cavalo! O que tivesse que acontecer aconteceria, nada mais poderia fazer e passei o resto do meu tempo ao lado do meu tio até a travessia do rio.
Ao final da tarde, já a noitinha, cheguei a casa e encontrei papai e mamãe aflitos querendo saber como foi o dia e porque chegara tão tarde. Contei que havia vendido tudo e que havia encontrado o tio Pedrinho lá no Sapecado e que havíamos atravessado a Balsa juntos, depois passei para ver a tia e por isso a demora.
Nem queria imaginar se o tio Pedrinho viesse a contar-lhe sobre o cavalo. Porém sabia que assim que meu pai estivesse com ele isso seria inevitável. A verdade é que comecei a sofrer antecipadamente. Certo dia meu pai esteve no Porto e quando voltou veio direto ralhar comigo. Ele não costuma bater em mim, nem nos meus irmãos, mas só o modo que falava ralhando era o suficiente para ficar muito triste e até chorar. Vez ou outra, em caso mais grave levava-se uma palmada ou um puxão de orelha. Não mais que isso.
Mas atravessar a balsa com o cavalo nunca mais! Voltei mais vezes em busca da freguesia lá para os lados do Sapecado, mas sempre deixando o cavalo amarrado ao bambuzal que fica ao lado da base da Balsa. E jamais esqueci do encontro inesperado com meu tio.
Depois de quase cincoenta anos, outro dia destes, falei com meu tio sobre essa passagem, ele sorriu e com sentimento de culpa disse-me: - Uai, você me desculpa então, eu não sabia que você teria problemas.

Osso da sorte

Domingo na roça … Nos tempos de criança os almoços na roça eram frequentes ora na sede da fazenda da vovó,ora na fazenda do tio Orozimbo, ou nalguma outra fazenda de parentes e amigos.
Uma coisa era certa eu e meus primos ” Tonho”, Jane, Ariete, Cida, Denise frequentemente estávamos juntos.
Após o almoço o osso da sorte, geralmente uns três ou quatro já desossados eram colocados no sol ou na chapa do fogão a lenha para secar e depois tirar a sorte.
Sorte? Sorte de quê? Não sei!
Mas antes mesmo de ficar a posto para a disputa, a ansiedade era era grande.
– Eu vou ganhar. ( dizia Adauto)
– Não quem vai ganhar sou eu. ( em voz chorosa dizia Tonho.)
Assim era os momentos angustiantes antes de ter os ossos secos e prontos para a disputa.
Geralmente. Jane por ser mais velha era a juíza. Mas as vezes tio Orozimbo ou mamãe fazia o papel de coordenadora.
Chegada a hora… Olhos fixos no osso… Aguardava a contagem.
Um… Dois… Três …já!
O momento chegava… Independente do resultado… O perdedor sempre reclamava. Uns choravam, outros ficavam emburrados.
Mas a tradição era perpetuada e com o tempo a tradição foi ficando apenas na lembrança, por falta da presença dos jogadores que uns partiram pra bem longe, outros separados por longos kilomentros.
Assim é o mundo encantado das crianças…
Pequenos eventos, costumam fazer a diferença.
É muito importante perpetuar tradições, costumes e passar através da escrita para gerações futuras.É muito importante perpetuar tradições, costumes e passar através da escrita para gerações futuras.

Inocência na luz vermelha

Chegara as tão sonhadas férias. Eu tinha meus 15 anos, estava estudando no Seminário em Itajubá, Sul de Minas Gerais. Só visitava minha família nas férias.
No meio do ano eram pouco mais de 15 dias então passava em São Paulo com meus pais e irmãos. Mas as férias de final de ano, as mais esperadas ia para São Paulo e depois de ficar alguns dias com meus pais, geralmente depois do Natal ia com minha mãe e meus irmãos para a cidade natal, Campo Belo.
Revia os primos, os tios, e a maior parte do tempo queria passar na roça, na fazenda com meus avós. Como eram gostosos estes dias que lá passava.
Finais de semana íamos todos para a cidade, não que eu gostasse, pois na fazenda era muito mais divertido, mesmo quando só eu estava lá. Andava a cavalo, nadava muito, escalava morros e sem falar na fartura de frutas que lá havia.
Quando estava na cidade costumava passar algum tempo em companhia dos primos e principalmente do Nardinho, um primo em segundo grau, mas para mim todos eram primos. Ele era um pouco mais velho que eu e costumava me levar para um restaurante em frente a Praça da Matriz, esquina com a Afonso Pena e lá entre conversas e animação íamos saboreando um torresminho e tomando uma cerveja. Não estava acostumado a tomar cerveja, mas pela sua insistência eu o acompanhava.
Nardinho era uma destas pessoas que conhecia todos da cidade e apresentava-me a todos os seus amigos.
Certo dia ele disse-me - hoje a noite passo na casa da vó Anita para te pegar, quero levá-lo a casa de uma amiga.
Como eu gostava da companhia do primo não poderia recusar o convite.
A tardezinha, já anoitecendo fomos nós em direção a Estação Ferroviária à visita combinada.
Chegamos a uma casa próximo a Estação onde ele foi entrando e cumprimentando a todos.
Entramos por uma sala ampla, com algumas mesinhas e cadeiras onde algumas pessoas conversavam, geralmente casais. Logo encontrou uma moça a qual fui apresentado.
- Este é o Adauto, meu primo ele está estudando no Seminário - disse ele a moça.
Em seguida me vi sentado a uma mesinha com aquela moça que começou a conversar comigo e a perguntar-me sobre a vida lá no Seminário. Como era, o que eu fazia, etc...
Logo notei o desaparecimento do meu primo e continuei lá naquela sala em penumbra, havia algumas lâmpadas vermelhas tornando o ambiente um tanto reservado.
Não faltaram assuntos, a moça parecia curiosa a perguntar-me sobre o meu dia a dia e eu calmamente e inocentemente continuei a responder a tudo até que começou a faltar-me assunto e ela já meio sem graça também silenciou. Vez ou outra lançava-me um olhar e um sorriso.
Indaguei-me sobre o Nardinho, onde teria ido e ela calmamente me acalmou dizendo que logo estaria lá de volta. Tratou de reforçar o prato de petiscos e pedir mais cerveja.
Já se fazia tarde, minha ansiedade e meu desconforto ali aumentava.
Foi ai que surgiu o Nardinho acompanhado de outra moça que da mesma forma da primeira apresentou-me como seu primo que estudava no Seminário.
Perguntou a minha anfitrião se gostou de mim, esta respondeu que sim meia encabulada também.
Despedimos-nos e fomos para casa, minha mãe e minha avó devia já estar preocupadas comigo.
Caminhamos meio em silêncio sem ao menos comentar sobre a visita e cada qual foi para sua casa como se nada tivesse acontecido.
Minha mãe e minha avó nada perguntaram e logo fui para o meu quarto ainda sem saber exatamente o que era aquele lugar que conhecera. Achara sim um tanto estranho, pois a casa apesar de pessoas aparentemente felizes, comendo e bebendo, achei-as um tanto frias para ser uma casa e de amigas do Nardinho.
Passou-se um ou dois dias... pude ouvir a tia Arlete - que era uma daquelas pessoas alegras com uma risada contagiante e forte - contar para o tio Juarez, outras tias e amigas que o Nardinho havia me levado a Zona.
Foi ai então que compreendi o motivo daquele convite. Mas continuei na minha inocência sem ao menos ter deixado ser iniciado.Fiquei morrendo de vergonha, encabulado e evitei confrontar-me com os tios por um bom tempo, se contaram para minha mãe não sei, porque nunca ouvi comentário por parte dela.
Nunca mais falamos sobre o assunto e muitos anos se passaram, mais de 40 anos, outro dia comentei o episódio pela primeira vez com o Nardinho durante uma conversa com ele, no Messenger, visto que mora em Brasília desde aquela época e nunca mais o encontrei, somente agora pela internet.
- Ah, isso não foi nada, das coisas que eu aprontava esta foi a menor. - disse-me ele !
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Sou um viajante do tempo, em busca de meus sonhos; na minha caminhada costumo ser alegre... rio, choro, me emociono com o olhar de uma criança, com o brilho do sol, da lua; o cantar dos pássaros. Sou um simples mortal que acredita na imortalidade da essência do Ser, do espírito . . As coisas que eu gosto? ... são as mais simples que existem. Gosto de ver o sol nascer, se por... ver a lua bailar no infinito espaço, e as estrelas enfeitando o manto negro e majestoso da noite... (e só de pensar que viemos e iremos ainda para alguma delas, chega a dar saudade ... !) Ver o rio correr tranqüilo seguindo seu curso sem reclamar, ouvir o sussurro do vento, o som dos pardais ao entardecer, o sorriso de uma criança, a sensualidade feminina, e tantas outras coisas mais que nos rodeiam!Como eu vejo as pessoas? ... Vejo as todas companheiras de viagem, indo em busca de algo; são viajantes das mais diferentes origens, oriundas de algum lugar do Universo e na maioria das vezes perdidas sem saber para onde irão e o que buscam ! Isto é triste! Sonhos ? ... sou um eterno sonhador ! " Sei, que n'algum lugar, muito além dos horizontes... nossos sonhos realmente acontecem! " Vou-me embora para PASARGADA , sonho de todo poeta, ir se embora para Pasárgada,..... Sinto-me privilegiado possuidor das chaves deste lugar, entretanto, sei que nada vale a pena se não for fruto de nosso próprio esforço... Do que adianta ser amigo do rei, ter tudo que se imagina e não ser feliz ? Prefiro seguir meu caminho, colhendo todas as pedras que encontro na estrada e utiliza-las para meu caminhar. Quem quiser ... acompanhe-me e caminhemos juntos!
Diones
Esse escrito me fez lembrar a minha amada! Gostei muito. Parabéns...
05/novembro/2018

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