DÉBORA
-Débora, não mexa nisso!
Débora se virou para a voz e, com seus passos curtos, continuou explorando o jardim.
-Débora, tire isso da boca!
Que nojo! Ela sentiu o goto ruim daquele pedaço de tijole e cuspiu a terra longe. Curiosa, continuou andando.
-Débora, cuidado! Vai cair se continuar assim.
E de fato levou um tombo. Não deveria ter corrido. Ainda bem, só esfolou o joelho.
-Débora, pare de chorar! Não foi nada. Logo sara.
Seu choro era inútil. Não era o suficiente para passar a dor. Parou de chorar.
-Enxugue essas lágrimas. Que coisa feia!
Ela se levantou. Estava com medo de parecer feia.
-Débora, o que você está fazendo?
Dessa vez estava quieta, brincando com uma formiga.
-Tire o dedo daí! Tem bichinhos que podem te machucar.
Com susto, parou de tentar colocar a mão no formigueiro.
-Venha, Débora, vamos entrar para tomar banho. Hoje é seu aniversário.
O que era aniversário mesmo? Já tinha ouvido essa palavra mas não conseguia lembrar exatamente.
-Cuidado, não espirre muita água. Está molhando todo o banheiro.
Como era gostoso brincar na hora do banho!
-Tire o sabonete da boca, isso não é para comer.
Argh, que horrível! Era amargo. Jogou de volta à água.
-Agora vou lavar seu cabelo. Feche os olhinhos para não entrar sabão.
Que choradeira! Seus olhos queimavam.
-Pronto, já passou.
Ela estava impecável. Cheirosa, com roupas novas e bem penteada. Alguém bateu à porta:
-Rosa, pode trazer a Débora que já arrumamos a mesa, os balões e os convidados.
Fecharam a porta e deixaram as duas sozinhas.
-Vamos lá, meu amor. A tia Rossa vai te levar para cantar parabéns.
Então, um nó na garganta a sufocou. Olhou em volta. Todas aquelas camas alinhadas, aqueles desenhos pendurados na parede lhe traziam lembranças de quando ali chegou. Antes, era apenas mais uma enfermeira, mas naquele lugar aprendeu a ser humana, a rir e chorar com cada uma daquelas pessoas especiais, que para muitos não passavam de deficientes mentais. Para Rosa, eles eram sua família! Enxugou as lágrimas e levou débora até a cozinha, onde todos os enfermeiros, médicos, internos e convidados a aguardavam.
-Parabéns pra você...
Débora pediu bolo e alguém se aproximou:
-Rosa, quanto tempo Débora está aqui?
-Desde que nasceu.
-Dezesseis anos?!
-É, dezesseis anos... - e calou-se com um pedaço de doce.
ANO: 1999
ANO: 1999
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