RONALDSON
Poeta, escritor, artista visual, ilustrador, compositor e crítico.
O Caracol
Ali no quintal
(onde a flora desembesta),
faz pirueta a ondadura
sobre língua muda, que desliza
– antenada escultura.
Bicho-trailer,
carregando um pôr de sol
– cristalino como a mágoa,
é lesma resignada em
rodopio, o caracol.
Bichinho tão casa e calma
tão doçura cepacol,
pelas folhas de hortelã:
caramujo, caramundo
escargô-tobogã.
Tão visgo e vidro,
a arquitetura de giros,
vê-se toda luz transpassada
pela carapaça-vidraça:
acesa, a carne lerda
sonha outonos verão.
Caramudo, caracol
(bioparabólica aspiral)
modelado a sal si bemol
furacão de osso, cor de arrebol.
Ah carrancudo caracol,
caramelo, agonia cachecol
que a mão do vento
em casca e cálcio, esculpiu
a cruz do bichinho:
pedra e redemoinho.
Do livro "Questão de íris", 1997.